segunda-feira, 16 de novembro de 2009

2012

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Por Nuno Crato

ONTEM, SEXTA-FEIRA 13, o filme "2012" estreou em todo o mundo; Portugal não foi excepção. É uma saga da destruição do nosso planeta, com muitos planos espectaculares. Não o vi, por isso não sei se é divertido ou se é apenas repetitivo e enfadonho. Imagino que um filme sobre o fim do mundo deva ser pândego, com muitas mortes carecas e porta-aviões a irem ao fundo. A escolha da data de estreia denota, pelo menos, algum sentido de humor.

O que não é nada divertido é que haja muita gente a levar a sério os receios de um cataclismo cósmico para esse ano de 2012. O alarme começou há algum tempo. Em 1975, Frank Waters, um autor sensacionalista, detectou uma curiosidade no calendário maia, que em 2012 acabará um ciclo, e especulou sobre um cataclismo que lhe estaria associado. Em 1987, José Argueles, que se autoproclama "historiador visionário", juntou-se aos alarmistas. E, em 1995, John M. Jenkins, escreveu novo livro sobre a "Cosmogénese Maia", juntando mais umas pitadas às previsões de catástrofe. Daí para cá, muita gente tem ganho dinheiro à custa dos incautos.

As previsões do fim do mundo não são novas. No fim do primeiro milénio, muita gente pensava que o juízo final chegaria com o ano 1000. Em 2000, houve quem receasse o mesmo, o que leva a concluir que não basta o progresso para calar a ignorância. Ainda em 2000, os profetas da desgraça voltaram à carga com um alinhamento de planetas. O alinhamento realizou-se em 5 de Maio desse ano e nada aconteceu, como era de esperar - ao longo dos milénios registaram-se muitos alinhamentos de planetas, sem qualquer efeito sobre a nossa Terra. De facto, o efeito gravítico diferencial, somado, de todos os outros planetas do sistema solar sobre o nosso é muito menor do que o da Lua. E se o leitor colocar uma maçã perto da sua cabeça, o correspondente efeito de maré que sofre é maior que o de um alinhamento de planetas - o físico Lawrence Krauss deu-se ao trabalho de o calcular. Não obstante esta desmistificação e não obstante as lições dos alinhamentos passados, os alarmistas voltam a prever desastres para 21 de Dezembro de 2012, data em que anunciam novo alinhamento planetário. O cúmulo do ridículo, como se tudo isto não bastasse, é que nessa data não haverá nenhum alinhamento: Júpiter estará numa direcção, Saturno noutra, e por aí adiante.

A fabricação do ano 2012 como ano catastrófico baseia-se numa infantilidade. Estudando o calendário maia, os profetas da desgraça notaram que este se baseia em ciclos dentro de ciclos. Há três ciclos menores, de 13, 20 e 365 dias, respectivamente. E há ciclos de contagem longa, que culminam no baktun, compreendendo 144 mil dias. Segundo os cálculos modernos, imagina-se que o calendário maia tenha começado dia 8 de Setembro de 3114 (a.C., calendário juliano). Pelo que o dia 23 de Dezembro de 2012 seria o fim de um ciclo de 13 baktun. Na notação maia, isso significa que esse dia apenas poderia ser escrito como uma série de zeros, pois não haveria mais símbolos para o denotar. Pensar que isso acarreta o fim do mundo é tão ingénuo como imaginar que um carro explode quando o contador de quilómetros percorridos dá a volta e fica a zeros.

«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 14 de Novembro de 2009