quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Tomar no traseiro

Por Antunes Ferreira
O TÍTULO desta crónica não é exatamente o que o ex-secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, escritor e apresentador televisivo, escreveu sem margem para dúvidas: vá tomar no cu. Há que dizer, antes do mais, que a expressão é um brasileirismo: entre nós usa dizer-se levar no cu. Para um governante que até há pouco fez parte do (des)Governo do Coelho, ainda por cima sobraçando a pasta da Cultura, o escrito parece ser pertinente. O Acordo Ortográfico em vigência não se refere a expressões desse jaez, reporta-se principalmente à ortografia, tanto quanto sei.
Mas, vamos a factos e para tal permito-me transcrever a notícia saída a terreiro no diário «Público», faz hoje oito dias, mesmo sem ter pedido autorização ao referido quotidiano.
«Francisco José Viegas dedica esta quarta-feira um post no seu blogue ao actual secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, onde lhe deixa um aviso sobre o que fará se for abordado por um agente da Autoridade Tributária e Aduaneira.
“Queria apenas avisar que, se por acaso, algum senhor da Autoridade Tributária e Aduaneira tentar fiscalizar-me à saída de uma loja, um café, um restaurante ou um bordel (quando forem legalizados) com o simpático objetivo de ver se eu pedi fartura das despesas realizadas, lhe responderei que, com pena minha pela evidente má criação, terei de lhe pedir para ir tomar no cu, ou, em alternativa, que peça a minha detenção por desobediência”.
“Ele, pobre funcionário, não tem culpa nenhuma; mas se a Autoridade Tributária e Aduaneira quiser cruzar informações sobre a vida dos cidadãos, primeiro que verifique se a Comissão Nacional de Proteção de Dados já deu o aval, depois que pague pela informação a quem quiser dá-la”», justifica o ex-governante.
Francisco José Viegas foi secretário de Estado da Cultura do Governo de Passos Coelho até Outubro de 2012, data em que apresentou a sua demissão, invocando motivos de saúde. O PÚBLICO tentou repetidamente falar com o ex-governante, sem sucesso».
Ora muito bem, o que quer dizer ora muito mal. Viegas utilizou o vernáculo que entendeu, sem cuidar das repercussões que o conselho iria ter por este cada vez mais triste País? Presumo que não. Quando escreveu que a ser abordado por um qualquer funcionário (recorde-se, e Viegas devia ser o primeiro a reconhecê-lo, que hoje não há funcionários, há, sim, trabalhadores da Função Pública…) mais zeloso da ATA, à saída de um restaurante ou instituição similar quisesse fiscalizar a respeito de fatura, o mandaria tomar no cu, o escritor e ex-governante sabia o que escrevia. Não consta que tenha tido qualquer alucinação, ainda que temporária, que tivesse fumado mais charros que (ainda) são proibidos, ou que tenha sido atacado por uma qualquer ATAfobia.

Escreveu, está escrito, diziam os Romanos e com carradas de razão que verba volant, scripta manent. Ou seja, as palavras voam, as escritas permanecem. Nada a acrescentar ao que publicou no blogue dum seu antigo companheiro deste caótico Governo que diz que nos governa. Mas também pode acontecer que o puritanismo, a decência e a moral pública o qualifiquem de mal-educado. Ou a Igreja o excomungue. Nada disso. Eu, pelo menos espero bem que tal não aconteça; mas.pelo andar da carruagem…

 

O mais curioso, e continuo a transcrever o texto do «Público», foi que «Questionado pelos jornalistas sobre estes comentários na conferência de imprensa no final do Conselho de Ministros, o ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares afirmou não os ter lido e disse que respeita "a opinião de todos os portugueses, tenham ou não feito parte do Governo". Miguel Relvas acrescentou que o executivo sabe que "as medidas são difíceis e delicadas", mas realçou que cabe a quem decide tomá-las fazê-las aplicar».

 

Tentando traduzir: seja ou não seja ex-membro do Executor, digo, Executivo que diariamente nos executa, qualquer cidadão poderá mandar tomar no cu a outro cidadão, sem que daí venha qualquer mal a público ou, até, sem receber dois sonoros pares de estalos. Isto porque Ervas, perdão, Relvas, respeita a opinião de todos os Portugueses, etc. O licenciado só com uma cadeira – que não a que talvez merecesse, isto é a elétrica – é um fervoroso adepto de expressões sem qualquer má intenção. Recorda-me até a célebre intervenção de Ramada Curto em pleno tribunal a propósito do termo usado pela Acusação - filho de puta.

 

Assim, numa terra como a nossa, não é motivo de agravo, muito menos de punição, mandar um sujeito, no caso um fiscal da ATA, tomar no cu. E se o dissessem a Relvas?