Por Nuno Crato
A MENTE HUMANA arquiva informação e recupera informação. Até há pouco tempo admitia-se que estes processos cognitivos funcionavam separadamente: arquiva-se a informação na memória e vai-se buscá-la depois. No entanto, alguns estudos recentes da psicologia cognitiva sublinharam que o processo de retenção da informação não é distinto do processo da sua recuperação e que este último reforça o primeiro. Sendo assim, a actividade de teste torna-se um processo de aprendizagem, pois a recuperação de conhecimentos vai consolidar a sua assimilação.
A experiência dos professores dá indicações no mesmo sentido: testando os alunos está-se a ajudá-los a aprender. No entanto, algumas teorias pedagógicas separaram os dois processos e desenvolveram argumentos contra a avaliação, opondo-a à chamada «aprendizagem significativa». Esta última necessitaria de uma construção activa do conhecimento e, segundo algumas correntes educativas radicais, a memorização seria um inimigo da compreensão.
Num estudo agora publicado na revista «Science», dois psicólogos norte-americanos, Jeffrey D. Karpicke e Janell L. Blunt, trouxeram novos argumentos a favor do papel da avaliação no aumento do conhecimento (doi: 101126/science.1199327).
Numa experiência envolvendo 200 estudantes, compararam diversos métodos de estudo. Deram a todos um mesmo texto científico para ler e formaram quatro grupos. No primeiro grupo, os estudantes tiveram simplesmente cinco minutos para ler o texto. No segundo, estudaram o mesmo texto em quatro sessões consecutivas de cinco minutos cada. No terceiro, analisaram o texto usando um tipo de diagramas agora em voga, os chamados «concept mapping», por vezes traduzidos como «mapas de conceitos» ou «diagramas conceptuais». No quarto, testaram o que tinham percebido: o texto foi primeiramente lido e recolhido, os estudantes escreveram um resumo do que se lembravam, leram novamente o texto e foram de novo testados.
Qual destes grupos terá apreendido melhor os conceitos?
Não causará surpresa saber que, uma semana depois, os estudantes do primeiro grupo (simples leitura) eram os que pior tinham retido a informação. O que é verdadeiramente surpreendente é que os estudantes do segundo e terceiro grupos (leitura repetida e construção de diagramas) retiveram o mesmo nível de conhecimentos. Surpresa maior ainda é o facto de os estudantes do quarto grupo (testes repetidos) terem sido os melhores. Poder-se-á pensar que estes se limitaram a memorizar mais. Mas não. Os estudantes que foram duplamente testados também responderam melhor a questões mais profundas, que obrigavam a relacionar os conceitos.
Este estudo, que vem desenvolver alguns resultados da psicóloga experimental norte-americana Sean Beilock, de que já aqui falámos, e de outros cientistas, coloca em causa a prática repetida dos diagramas conceptuais. Para quem detesta aquelas figuras com muitas bolinhas e muitas setas que agora se usam para ilustrar conceitos, estas são boas notícias. Mas há algo mais profundo. Como dizem os autores, «o facto de uma tarefa (no ensino) ser ou não considerada ‘activa’ não é indicador da aprendizagem que ela induza».
São más notícias para as teorias que defendem um ensino baseado em «actividades investigativas» dispersas, que alegadamente permitiriam a «construção activa do conhecimento». Ou para as que criticam a simples recapitulação de conceitos, por ser «acrítica». E são boas notícias para as que defendem um ensino estruturado, com metas claras e com avaliação repetida.
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«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 6 Fev 11
A MENTE HUMANA arquiva informação e recupera informação. Até há pouco tempo admitia-se que estes processos cognitivos funcionavam separadamente: arquiva-se a informação na memória e vai-se buscá-la depois. No entanto, alguns estudos recentes da psicologia cognitiva sublinharam que o processo de retenção da informação não é distinto do processo da sua recuperação e que este último reforça o primeiro. Sendo assim, a actividade de teste torna-se um processo de aprendizagem, pois a recuperação de conhecimentos vai consolidar a sua assimilação.
A experiência dos professores dá indicações no mesmo sentido: testando os alunos está-se a ajudá-los a aprender. No entanto, algumas teorias pedagógicas separaram os dois processos e desenvolveram argumentos contra a avaliação, opondo-a à chamada «aprendizagem significativa». Esta última necessitaria de uma construção activa do conhecimento e, segundo algumas correntes educativas radicais, a memorização seria um inimigo da compreensão.
Num estudo agora publicado na revista «Science», dois psicólogos norte-americanos, Jeffrey D. Karpicke e Janell L. Blunt, trouxeram novos argumentos a favor do papel da avaliação no aumento do conhecimento (doi: 101126/science.1199327).
Numa experiência envolvendo 200 estudantes, compararam diversos métodos de estudo. Deram a todos um mesmo texto científico para ler e formaram quatro grupos. No primeiro grupo, os estudantes tiveram simplesmente cinco minutos para ler o texto. No segundo, estudaram o mesmo texto em quatro sessões consecutivas de cinco minutos cada. No terceiro, analisaram o texto usando um tipo de diagramas agora em voga, os chamados «concept mapping», por vezes traduzidos como «mapas de conceitos» ou «diagramas conceptuais». No quarto, testaram o que tinham percebido: o texto foi primeiramente lido e recolhido, os estudantes escreveram um resumo do que se lembravam, leram novamente o texto e foram de novo testados.
Qual destes grupos terá apreendido melhor os conceitos?
Não causará surpresa saber que, uma semana depois, os estudantes do primeiro grupo (simples leitura) eram os que pior tinham retido a informação. O que é verdadeiramente surpreendente é que os estudantes do segundo e terceiro grupos (leitura repetida e construção de diagramas) retiveram o mesmo nível de conhecimentos. Surpresa maior ainda é o facto de os estudantes do quarto grupo (testes repetidos) terem sido os melhores. Poder-se-á pensar que estes se limitaram a memorizar mais. Mas não. Os estudantes que foram duplamente testados também responderam melhor a questões mais profundas, que obrigavam a relacionar os conceitos.
Este estudo, que vem desenvolver alguns resultados da psicóloga experimental norte-americana Sean Beilock, de que já aqui falámos, e de outros cientistas, coloca em causa a prática repetida dos diagramas conceptuais. Para quem detesta aquelas figuras com muitas bolinhas e muitas setas que agora se usam para ilustrar conceitos, estas são boas notícias. Mas há algo mais profundo. Como dizem os autores, «o facto de uma tarefa (no ensino) ser ou não considerada ‘activa’ não é indicador da aprendizagem que ela induza».
São más notícias para as teorias que defendem um ensino baseado em «actividades investigativas» dispersas, que alegadamente permitiriam a «construção activa do conhecimento». Ou para as que criticam a simples recapitulação de conceitos, por ser «acrítica». E são boas notícias para as que defendem um ensino estruturado, com metas claras e com avaliação repetida.
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