domingo, 16 de janeiro de 2011

«Dito & Feito»

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Por José António Lima

COMPARADA com a original candidatura de 2005, insubmissa e contra a corrente, esta reincidência presidencial de Manuel Alegre apareceu como um remake sem grande imaginação, tolhido pelos compromissos das amarras partidárias e enredado nas insanáveis contradições político-ideológicas entre os seus dois alicerces oficiais, o PS e o Bloco de Esquerda.


E se o caminho presidencial já era estreito e apertado, a crise em que o país mergulhou, os PEC uns atrás dos outros e as medidas de austeridade do Governo tornaram a campanha de Alegre virtualmente impossível. O candidato ficou sem linha de orientação, hipotecou a coerência do discurso, abandonou qualquer estratégia. Apoia a greve geral? Nem sim, nem não. Votaria o OE para 2011? Nem a favor, nem contra. Concorda com o corte de salários dos funcionários públicos? Não, mas eram talvez inevitáveis. E com a redução das pensões e apoios sociais? Há o Estado Social, mas também há a necessidade do Governo...

Foi neste estado, sem ânimo nem discurso político sustentável, que Manuel Alegre chegou ao debate com Cavaco Silva. No qual foi rápida e repetidamente encostado às cordas, como se esperava. Aí abandonando qualquer esperança, se é que ainda existia, de poder forçar uma segunda volta.

É por isso - pela falta de outras armas ou argumentos - que as pequenas baixezas políticas vieram ocupar o espaço da campanha: como as tendas alugadas do 10 de Junho, a fadista a contratar, as escutas inventadas ou a venda de acções do BPN (esquecendo-se, ao mesmo tempo, a colaboração de Alegre em anúncios do BPP).

É por isso e porque ao Governo de José Sócrates interessa, no problemático e perigoso ano político de 2011, que Cavaco Silva saia o mais debilitado possível da sua inevitável reeleição. E com a menor força política para os confrontos que se avizinham com o Governo. Daí a incessante campanha sobre as acções do BPN a encher páginas de jornais. Vale tudo. E quando o desespero aumenta, vale mesmo tudo.

P.S. - Eduardo Azevedo Soares foi um militar seduzido pela política, que analisava com prazer e recusando a superficialidade. Discreto e encantador no trato, era firme nos valores e sólido nos princípios, intransigente perante o populismo e o oportunismo na vida política. Foi sempre uma companhia estimulante, um cidadão íntegro e civicamente empenhado. Como poucos.
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«SOL» de 14 Jan 11