sábado, 15 de janeiro de 2011

Em tempo de guerras

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Por Antunes Ferreira

RAIO DE PAÍS este que nos caiu em sorte. Há piores, pois há. Mas, com o mal dos outros podemos nós bem, diz o povo com carradas de razão. Em termos comparativos, há que reconhecer que não somos o exemplo do descalabro que outros são, mas lá que andamos muito próximo dele, isso andamos.

No decurso da batalha de Inglaterra, Winston Churchill, respondendo aos trabalhistas sobre a gravidade dos bombardeamentos que a Luftwafe fazia sobre as cidades britânicas, afirmou que também a Royal Air Force, em retaliação, despejava milhares de quilos de explosivos nas urbes alemãs. Clement Atlee, o líder da oposição replicou então que o mal dos outros não evitava o mal dos ingleses. Ou seja, uma espécie de déjà vu ou vira-o-disco-e-toca-o-mesmo.

Nesta altura, em Portugal, temos quotidianamente notícias da campanha eleitoral para a Presidência da República que seguem o mesmo princípio. Todos os candidatos transformaram a competição num arraial de folclore descabido, sem varapaus, mas com muitas acusações pessoais.

É certo que o Presidente da República é um órgão unipessoal do Estado, aliás o único. O equilíbrio constitucional que se tenta manter no nosso País é instável q.b. Do que decorre destes dias é uma suspeição preocupante: estamos na corda bamba. O que, em tempo de crise, a maior que atravessamos pelo menos desde o 25 de Abril, deveria estar a preocupar-nos muito pesadamente.

Mas, não. O tema mais importante da actualidade é o assassinato do colunista social Carlos Castro. Têm-se publicado verdadeiros himalaias de asneiradas. O modelo Renato Seabra, presumido criminoso, é apoiado em sites por grupos de fãs caritativos e inconformados com o procedimento das autoridades nova-iorquinas. O rapaz até era um sujeito exemplar, amigo do seu amigo, filho esmerado, namoradeiro.

Mas tudo indica que matou barbaramente, mutilou, torturou Castro, dizem também que depois deste ter sucumbido ao ataque inconcebível de Seabra. A culpa desloca-se assim do assassino para o assassinado. O alegado jornalista, provocador e praticante exímio do assédio homossexual, foi, para estes beneméritos, quem esteve na base da sua eliminação. Portanto, avance-se com o coro homofóbico.

O que me parece é que não sabemos para onde nos devemos virar. Se para o Presidente/candidato - que afirma convictamente que é preciso que alguém nasça duas vezes para ser mais honesto do que ele - a reincarnação é assim um facto incontroverso, para o comum dos cidadãos, o coração deles balança entre Carlos e Renato. São duas telenovelas, ao fim e ao cabo. Ambas mais ou menos negras.

E o curioso é que se tenha sabido ontem mesmo que o jovem fora escolhido para ser mandatário da juventude em Cantanhede de… Aníbal Cavaco Silva

Com tudo isto, o enfarte agudo de Alberto João Jardim, tudo indica que a caminho da recuperação, limitou-se a ser uns quase peanuts. O patrão da Madeira devia ter direito a mais e melhor acompanhamento mediático. Mas, em tempo de guerras não se limpam armas.