terça-feira, 2 de setembro de 2008

Alianças em anos magros

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Por J.L. Saldanha Sanches
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2009, UM ANO DE CRISE e de eleições. Crise quer dizer necessidade constante de decisões políticas desagradáveis e impopulares. Eleições querem dizer que a maioria absoluta do PS vai provavelmente acabar.
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Como continuar com a política de reformas sem maioria estável?
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A nova edição de um governo com políticas guterristas é impensável. Só se pode negociar com toda a gente e conseguir aprovar leis e orçamento quando há sempre qualquer coisa para distribuir. Largueza financeira, em suma.
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Como havia no tempo em que a descida das taxas de juro criava um excedente: dinheiro para as regiões, dinheiro para as autarquias, para a educação e orçamento equilibrado.
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Na situação que aí vem não vai ser assim e as políticas que vão ser necessárias exigem uma maioria estável.
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Logo, que alianças vamos ter?
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Como o BE e o PCP não aceitam a necessidade da disciplina orçamental, o PS vai ter que fazer alianças à direita. Com quem?
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Se tudo continuar como está vamos ter três possibilidades: bloco central (com o que restar do PSD), aliança com o CDS ou com os deputados de Jardim. Que já explicou que está às ordens.
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Uma aliança com o actual CDS não será apenas contra natura. Portas vai para a Defesa e para mostrar o seu peso político (e por outros motivos) compra uma porta-aviões. Ou qualquer outra coisa tão inútil e dispendiosa com os submarinos. O Dr. Portas tem uma imaginação muito fértil quando se trata de arranjar formas de gastar o dinheiro dos contribuintes.
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Jardim tem a vantagem de só querer dinheiro para a Madeira. O resto não lhe interessa, é instrumental. Mas quem diz Madeira, diz Açores e a mesma dependência doentia dos subsídios públicos.
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Em anos de contenção das despesas, não está mal.
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A terceira hipótese é o bloco central. Uma hipótese desagradável e desprestigiada.
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Mas com funciona o bloco central e quais são as suas consequências?
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Será mais propício ao crescimento da corrupção e do tráfico de influências (as clássicas maleitas da economia portuguesa) do que o governo de um só partido? Dará mais poder e mais lugares às clientelas esfomeadas? Criará um ambiente mais ou menos favorável para se prosseguir com reformas?
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Os acordos para os grandes negócios que geralmente passam pelos principais partidos contribuirão mais ou menos para distorcer a economia se a aliança entre os dois partidos for não apenas privada mas também pública?
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As questões centrais são estas: os males tradicionais da sociedade portuguesa podem aumentar ou diminuir conforme o PS escolha uma solução que lhe dá mais poder (para Jardim ou Portas uma sobras são suficientes) ou a que permite políticas mais racionais. Escolhendo os parceiros mais exigentes em vez dos mais desesperados.
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Por vezes, a escassez permite soluções mais racionais: e as dificuldades dos próximos anos são a única certeza que nos resta. Não vamos ter margem para um aumento das despesas públicas, nem para partilhas orçamentais.
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As alianças e as políticas vão ser todas elas condicionadas pela escassa margem de decisão: por isso qualquer solução tem que ser considerada na perspectiva da escassez de recursos e das consequências das coligações para a gestão dessa escassez.
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A crise económica irá dar o tom essencial a qualquer política de alianças.
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«Expresso» de 30 de Agosto de 2008 - www.saldanhasanches.pt
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