quarta-feira, 30 de setembro de 2009

O perdedor que venceu

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Por Baptista-Bastos

O PS ganhou as eleições. Ganhou quê, para quem e para quê? É uma vitória de Pirro, que impele José Sócrates para a fronteira flutuante dos grandes compromissos. O sr. Francisco Van Zeller, presidente da CIP, já falou, e disse ser uma catástrofe, acaso o PS seguisse a sua natureza e fizesse acordos "à Esquerda". O sr. Van Zeller apoiaria, isso sim, uma aliança com o CDS, progressivamente elaborada, criadora de outras infinitas cumplicidades. Não é uma impossibilidade moral nem uma imponderabilidade política. O PS possui um historial dessas "associações", e nada me induz a excluir uma eventual calorosa relação de Sócrates com Portas. Enoja-me e envergonha-me. O que é, declaradamente, outra coisa.

A "EXTRAORDINÁRIA VITÓRIA" do PS, proclamada pelo secretário-geral do partido, não assegura uma identidade "socialista". Coloquemos a euforia em formol, paremos um pouco para pensar, e verificaremos, assim, que o vencedor é refém da fluidez da sua vitória. O reordenamento parlamentar, com as subidas (essas, sim, extraordinárias) do Bloco e do CDS, causam uma dependência política do PS, sob uma espécie de dupla imposição, incapaz de afrouxar pela própria índole daqueles dois partidos. Não auguro nada de bom, para todos nós, nos próximos tempos.

O PSD está esfrangalhado. Não é de agora. Depois dos intermezzos cómicos de Durão e de Santana, Luís Filipe Menezes tentou conciliar o partido com o respeito por si mesmo. Menezes é um homem culto, lido, cortês, que procurou, na prática, ter em conta as "sensibilidades" do PSD e, acaso, restitui-lo à matriz inicial. Foi dizimado, entre outros, por Pacheco Pereira, para quem a convivência política torna-se num impedimento a suprimir. Com a derrota do PSD, o Pacheco é, por sua vez, olhado de viés, e os ajustes de contas não tardarão. Que faz correr, e ter atitudes intelectualmente reprováveis, este homem calculado, gelado e inteligente? O atabalhoamento com que tenta atenuar a derrota da sua estratégia chega a ser uma piada cruel, como abundantemente ficou demonstrado anteontem, na SIC-Notícias, no encontro com Pedro Silva Pereira.

Manuela Ferreira Leite, católica, antiga e distante, foi, de repente, colocada à frente de um partido cujas características variam, por ausência total de ideologia e excesso de ressentimentos. Dois terços do PSD não a tomavam a sério. O outro terço bajulava-a sem convicção. Uma fatia larga da vitória do PS deve-se à sua total incapacidade de criar laços e ao canhestro das suas proposições; não propostas, proposições.

Este imenso cenário está montado numa extraordinária bizarria do sistema. Vejamos: todos os partidos aumentaram de deputados, incluindo o PSD. O PS, o único que perdeu em votos e em parlamentares, foi, afinal de contas, o vencedor!

«DN» de 30 de Setembro de 2009