Por Alice Vieira
AINDA NÃO É HOJE que vou falar da gripe. Toda a gente fala da gripe, toda a gente acorda a fazer contas aos novos caso que aconteceram durante a noite, ou, se não aconteceram, se Deus quiser estão mesmo, mesmo para acontecer — que é fatal falar da gripe.
Mas de cada vez que eu penso “é hoje!”, acabo sempre por ler nos jornais qualquer coisa que passa à frente do Tamiflu e dos kits e de toda essa parafernália gripal.
No caso presente… o Magalhães.
Concordo que já não é assunto novo, mas eu ainda não falei do Magalhães, e até me estou a sentir mal por isso, a Senhora Ministra até pode pensar que eu não gosto do Magalhães, que tenho qualquer coisa contra esta espécie de Tamagochi a que as crianças dão mais carinho do que aos velhotes lá de casa, o que até se percebe, no Magalhães está a salvação da pátria, e os velhotes só dão chatices, estão sempre a precisar de remédios, pingam do nariz, e não servem para nada.
Pois hoje li num jornal (não me lembro qual, mas não faz diferença porque deve ter vindo em todos, agora todas as notícias vêm em todos os jornais, a palavra “cacha” até já deve ter desaparecido) que as desigualdades educacionais se acentuavam cada vez mais porque nem todas as criancinhas tinham recebido os Magalhães a que tinham direito.
Assinei logo por baixo - e tenho até ideia de organizar um movimento no meu facebook: “Ajuda a fazer desaparecer as desigualdades: oferece um Magalhães usado em troca de um livro por abrir”. Tenho a certeza absoluta que, em menos de um segundo, o país inteiro estava a comentar: “gosto disto!”, acompanhado de milhares de hugs, e flowers, e suns e smiles.
Sou até capaz de jurar que, a esta hora, o meu amigo Sérgio Godinho já terá modificado a letra do refrão de uma das suas canções mais conhecidas e não tardaremos a ouvi-lo: “que era eu sem o Magalhães?/ que era o Magalhães sem mim?”
O meu homem, que tem a mania de ler o que eu vou escrevendo, está para aqui a dizer que a educação não se mede em Magalhães, e que se os professores continuarem todos a ser obrigatoriamente transformados em burocratas, a preencher papelada e relatórios em vez de utilizarem esse tempo a ensinar os miúdos — não há Magalhães que valha a este país. E que se os miúdos não forem ensinados a raciocinar, a fazer uma pesquisa, a usar um texto como deve ser, a não se limitarem a copiar o que vêem no écran — o Magalhães não serve para nada.
Mas isto é evidentemente má vontade dele, que está feito com os comunistas do sindicato…
Não lhe dou ouvidos: se em tempos idos um Magalhães deu a volta ao mundo, este vai dar a volta à cabeça de toda a gente. Que é exactamente o que se pretende.
AINDA NÃO É HOJE que vou falar da gripe. Toda a gente fala da gripe, toda a gente acorda a fazer contas aos novos caso que aconteceram durante a noite, ou, se não aconteceram, se Deus quiser estão mesmo, mesmo para acontecer — que é fatal falar da gripe.
Mas de cada vez que eu penso “é hoje!”, acabo sempre por ler nos jornais qualquer coisa que passa à frente do Tamiflu e dos kits e de toda essa parafernália gripal.
No caso presente… o Magalhães.
Concordo que já não é assunto novo, mas eu ainda não falei do Magalhães, e até me estou a sentir mal por isso, a Senhora Ministra até pode pensar que eu não gosto do Magalhães, que tenho qualquer coisa contra esta espécie de Tamagochi a que as crianças dão mais carinho do que aos velhotes lá de casa, o que até se percebe, no Magalhães está a salvação da pátria, e os velhotes só dão chatices, estão sempre a precisar de remédios, pingam do nariz, e não servem para nada.
Pois hoje li num jornal (não me lembro qual, mas não faz diferença porque deve ter vindo em todos, agora todas as notícias vêm em todos os jornais, a palavra “cacha” até já deve ter desaparecido) que as desigualdades educacionais se acentuavam cada vez mais porque nem todas as criancinhas tinham recebido os Magalhães a que tinham direito.
Assinei logo por baixo - e tenho até ideia de organizar um movimento no meu facebook: “Ajuda a fazer desaparecer as desigualdades: oferece um Magalhães usado em troca de um livro por abrir”. Tenho a certeza absoluta que, em menos de um segundo, o país inteiro estava a comentar: “gosto disto!”, acompanhado de milhares de hugs, e flowers, e suns e smiles.
Sou até capaz de jurar que, a esta hora, o meu amigo Sérgio Godinho já terá modificado a letra do refrão de uma das suas canções mais conhecidas e não tardaremos a ouvi-lo: “que era eu sem o Magalhães?/ que era o Magalhães sem mim?”
O meu homem, que tem a mania de ler o que eu vou escrevendo, está para aqui a dizer que a educação não se mede em Magalhães, e que se os professores continuarem todos a ser obrigatoriamente transformados em burocratas, a preencher papelada e relatórios em vez de utilizarem esse tempo a ensinar os miúdos — não há Magalhães que valha a este país. E que se os miúdos não forem ensinados a raciocinar, a fazer uma pesquisa, a usar um texto como deve ser, a não se limitarem a copiar o que vêem no écran — o Magalhães não serve para nada.
Mas isto é evidentemente má vontade dele, que está feito com os comunistas do sindicato…
Não lhe dou ouvidos: se em tempos idos um Magalhães deu a volta ao mundo, este vai dar a volta à cabeça de toda a gente. Que é exactamente o que se pretende.
«JN» de 1 de Agosto de 2009