segunda-feira, 8 de março de 2010

«Dito & Feito»

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Por José António Lima

José Sócrates
e Alberto João Jardim puseram para trás das costas mútuas antipatias pessoais e velhas divergências políticas para fazerem face à catástrofe que atingiu a Madeira. Sentaram-se à mesa e aprovaram em conjunto um plano de reconstrução e ajuda financeira que substituirá, de imediato, os polémicos efeitos da querela sobre a lei das Finanças Regionais.

Esta conjugação de esforços e de vontades entre irredutíveis adversários políticos para superar, num momento de crise, a devastação e os prejuízos que o temporal provocou na sociedade madeirense, foi devidamente elogiada como exemplo de sentido de Estado e de capacidade para enfrentar uma situação de emergência nacional.

Mas tudo o que cai no excesso acaba por se tornar contraproducente. E a encenação forçada que Jardim e Sócrates apresentaram ao país, na passada segunda-feira, ultrapassou os limites do bom senso e da credibilidade. «Quero agradecer ao Governo Regional...», adiantou Sócrates com a voz trémula. «Quem tem de agradecer somos nós...», interrompeu Jardim em tom enlevado. «Não, não... foi um gosto poder trabalhar convosco...», contrapôs Sócrates à beira da comoção.

Ora, não se pode, num dia, chamar todos os nomes e acusar de todas as malfeitorias um interlocutor político e, no dia seguinte, cair-lhe nos braços com uma lágrima contida ao canto do olho, como quem acaba de reencontrar um amigo de peito há muito desaparecido. Só nos últimos tempos, Jardim afirmou que Sócrates é «uma praga, o maior inimigo da Madeira desde o 25 de Abril» e que «num país democrático a sério já não era primeiro-ministro» com todos «os escândalos» que o têm rodeado, mas «o senhor Pinto de Sousa não abandona, porque tem lata para isto e muito mais». Sócrates, por seu lado, não se tem cansado de apontar «o défice democrático na Madeira» e de repudiar «o discurso radical e insultuoso» de Jardim.

Se os políticos não mantêm um mínimo de coerência nos seus comportamentos e de dignidade na imagem que transmitem arriscam--se a que a solidariedade e a entreajuda se confundam com hipocrisia e oportunismo de ocasião. Como foi o caso desta encenação mediática protagonizada por Jardim e Sócrates.

«SOL» de 5 Mar 10