domingo, 12 de dezembro de 2010

«Dito & Feito»

.
Por José António Lima

A CRISE ACTUAL da economia portuguesa não é um cisne negro nem um relâmpago no céu azul, não é uma ocorrência surpreendente.

A crise identificada no início de 2007 - dependência do endividamento, insuficiência de competitividade, excesso de intervencionismo do Estado, preferência pelos sectores de bens não transaccionáveis, etc. - prosseguiu os seus efeitos acumulando factores de agravamento (impossibilidade de crescimento das receitas do Estado e incapacidade para limitar o crescimento da despesa do Estado, acentuada com o envelhecimento demográfico, com o desemprego e com o constrangimento crescente do pagamento dos encargos financeiros do endividamento, interno e externo) até ao momento em que emerge a crise económica mundial.

Em suma: a primeira década do séc. XXI salda-se por um registo muito pobre da vida portuguesa, parecendo esta incapaz de se afirmar, faltando-lhe ideias, verdade, força, lucidez, substância, garra e densidade política. Foi uma década, mais do que perdida, historicamente inaceitável, porque vazia.

Na sociedade portuguesa, que tem vivido numa atitude interesseira e egoísta, sem horizonte e sem conteúdo, vazia de substância, é preciso substituir o facilitismo pela exigência, a vulgaridade pela excelência, a moleza pela dureza, a golpada pela seriedade, o videirismo pela honra, a ignorância pelo conhecimento, a mandriice pelo trabalho, a aldrabice pela honestidade.

Os parágrafos acima reproduzidos são excertos de textos de Ernâni Lopes e, apenas, um pequeno retrato da sua inesgotável e estimulante capacidade de análise. Ernâni Lopes era um homem íntegro e sábio, como poucos em Portugal. Foi «um príncipe do pensamento português», na bela definição do seu amigo e sócio José Poças Esteves.

Aliando uma insaciável curiosidade de saber a uma escola de sólidos valores de comportamento, Ernâni Lopes era um exemplo raro, nos planos intelectual e moral.

Com a profundidade do seu pensamento, o rigor das suas análises e a clarividência das suas propostas, deixou-nos caminhos abertos para o futuro do país. Saibamos nós ter a energia e a inteligência de os prosseguir.
.
«SOL» de 10 Dez 10