Por Antunes Ferreira
FAÇAM O FAVOR de me acreditar, o que desde já agradeço: não tenho vontade nenhuma de escrever. E, se eu gosto de o fazer… Porém, há momentos em que uma pessoa nem tem vontade de gostar daquilo que gosta. Este é um deles. Aqui onde me encontro, fora do País para onde voltarei já amanhã, afinal hoje para quem tem a paciência de (ainda) me ler, continuo a sentir o mesmo peso – se não maior – que me caiu em cima na quarta-feira, à noite.
Desculpem-me este desabafo. Talvez ele me ajude a acertar nas teclas do meu portátil, num quarto de hotel que não é a minha casa e por isso um tanto claustrofóbico. Mandei vir o combinado n.º 6 e o empregado do Room Service entregou-mo há uma meia hora. O ovo mexido e as fatias de presunto, enfim, engoli-os. As salsichas, as batatas fritas e o ketchup, abandonadas no prato, são um insulto aos que neste Mundo passam fome. E que são muitos.
A viagem contra-relógio impediu-me de acompanhar o nosso CPC aos Olivais. Na noite de quinta-feira, as horas no velório foram difíceis, sobretudo por encontrar gente que já não via há anos. A sala do Palácio Galveias fora-se enchendo, num ritmo de romagem que se acentuava momento a momento. Fora dos primeiros a chegar, estava agoniado do sofrimento, saíra para o frio da noite, sem eira nem beira.
Avião é uma chatice, preciso sempre de pedir à assistente que me forneça a extensão do cinto de segurança; problema dos gordos. E a cadeira é-me incómoda de tão apertada, num abraço desgarrado de violação da identidade – e da rotundidade. E, ainda, a impossibilidade de baixar a mesita das refeições também me mexe com os nervos. Tudo isto sem ter medo de voar. Que seria, se o tivesse?
No entanto, estou a debitar prosa sem sentido, quiçá sem qualquer intenção. Não obstante, há alturas em que, mesmo violentando-se, um homem tem de escrever. Há quem espere o texto habitual – e a esse não se deve faltar. Aprendi assim desde miúdo, reaprendi na lufa-lufa da informação, tinha de ficar algo que me levasse a fazer o que estou… a fazer.
Há textos que nunca gostei, nem gosto, nem gostarei, de alinhar no papel, agora no monitor do Compaq. São difíceis de parir, saem aos arranques, comprimem-me, deprimem-me. Não são impossíveis, são passíveis de auto-flagelação. Na vida e na morte, fatalmente. Porque a todos nos espera o mesmo fim.
Pronto, fico-me por aqui, esgotei a bílis, esgotei as meninges, esgotei-me. Hoje, sábado, o artigo não falha junto dos que esperam por ele. Os dias continuam. A perda, essa, ir-se-á atenuando. Raio de porra.
FAÇAM O FAVOR de me acreditar, o que desde já agradeço: não tenho vontade nenhuma de escrever. E, se eu gosto de o fazer… Porém, há momentos em que uma pessoa nem tem vontade de gostar daquilo que gosta. Este é um deles. Aqui onde me encontro, fora do País para onde voltarei já amanhã, afinal hoje para quem tem a paciência de (ainda) me ler, continuo a sentir o mesmo peso – se não maior – que me caiu em cima na quarta-feira, à noite.
Desculpem-me este desabafo. Talvez ele me ajude a acertar nas teclas do meu portátil, num quarto de hotel que não é a minha casa e por isso um tanto claustrofóbico. Mandei vir o combinado n.º 6 e o empregado do Room Service entregou-mo há uma meia hora. O ovo mexido e as fatias de presunto, enfim, engoli-os. As salsichas, as batatas fritas e o ketchup, abandonadas no prato, são um insulto aos que neste Mundo passam fome. E que são muitos.
A viagem contra-relógio impediu-me de acompanhar o nosso CPC aos Olivais. Na noite de quinta-feira, as horas no velório foram difíceis, sobretudo por encontrar gente que já não via há anos. A sala do Palácio Galveias fora-se enchendo, num ritmo de romagem que se acentuava momento a momento. Fora dos primeiros a chegar, estava agoniado do sofrimento, saíra para o frio da noite, sem eira nem beira.
Avião é uma chatice, preciso sempre de pedir à assistente que me forneça a extensão do cinto de segurança; problema dos gordos. E a cadeira é-me incómoda de tão apertada, num abraço desgarrado de violação da identidade – e da rotundidade. E, ainda, a impossibilidade de baixar a mesita das refeições também me mexe com os nervos. Tudo isto sem ter medo de voar. Que seria, se o tivesse?
No entanto, estou a debitar prosa sem sentido, quiçá sem qualquer intenção. Não obstante, há alturas em que, mesmo violentando-se, um homem tem de escrever. Há quem espere o texto habitual – e a esse não se deve faltar. Aprendi assim desde miúdo, reaprendi na lufa-lufa da informação, tinha de ficar algo que me levasse a fazer o que estou… a fazer.
Há textos que nunca gostei, nem gosto, nem gostarei, de alinhar no papel, agora no monitor do Compaq. São difíceis de parir, saem aos arranques, comprimem-me, deprimem-me. Não são impossíveis, são passíveis de auto-flagelação. Na vida e na morte, fatalmente. Porque a todos nos espera o mesmo fim.
Pronto, fico-me por aqui, esgotei a bílis, esgotei as meninges, esgotei-me. Hoje, sábado, o artigo não falha junto dos que esperam por ele. Os dias continuam. A perda, essa, ir-se-á atenuando. Raio de porra.