Por José António Lima
PASSOU QUINZE arrastados e pesados dias sem nada ter a dizer sobre as chocantes revelações de que o país tomou conhecimento com as escutas do processo Face Oculta. Quando, finalmente, falou, Manuel Alegre fez um discurso redondo. A criticar «a promiscuidade entre a Justiça, a política e a comunicação social» e a lamentar que «se esteja a viver uma crise política em vez de se procurar resolver as dificuldades» do país ou que não haja «segredo de Justiça quando a Justiça não funciona». Politicamente condicionado, partidariamente manietado, Alegre procurou dar duas no cravo e uma na ferradura, fugindo aos problemas de fundo que o caso Face Oculta coloca – a este estilo de exercício do poder de Sócrates, ao PS como partido democrático e a si próprio como referência dos socialistas.
Não o choca o despudor da manipulação desmedida e controleira feita pela rede de figuras próximas do primeiro-ministro sobre empresários e meios de comunicação social? A desqualificação e a ausência de ética política dos boys colocados em postos decisores, com ordenados e mordomias escandalosos? A falta de vergonha de utilizar, comprovadamente, empresas públicas e com participações do Estado para beneficiar os meios de informação amigos e asfixiar financeiramente os órgãos de comunicação desalinhados? Pelos vistos, choca pouco.
Este estilo Chávez não lhe causa um sobressalto democrático? Não abala as suas convicções em defesa do livre pensamento e expressão de ideias? Não lhe provoca um assomo de revolta contra o controleirismo? Pelos vistos, não.
Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não. Se, até em ditadura, isso já era uma certeza, em democracia não é possível silenciar todos os que os discordam ou informam com liberdade e independência – por muitos boys e aparelhos de poder que se tenham ao serviço e à disposição.
É pena que Manuel Alegre não junte a sua voz aos que se demarcam desta vocação manipuladora e com tiques totalitários. Que não esteja do lado dos que resistem e dizem não. O seu passado cívico e político exigia-o. E a sua candidatura a Presidente da República não sairia tão manifestamente diminuída pelos seus silêncios, omissões e cumplicidades com estas práticas antidemocráticas.
«SOL» de 26 Fev 10
PASSOU QUINZE arrastados e pesados dias sem nada ter a dizer sobre as chocantes revelações de que o país tomou conhecimento com as escutas do processo Face Oculta. Quando, finalmente, falou, Manuel Alegre fez um discurso redondo. A criticar «a promiscuidade entre a Justiça, a política e a comunicação social» e a lamentar que «se esteja a viver uma crise política em vez de se procurar resolver as dificuldades» do país ou que não haja «segredo de Justiça quando a Justiça não funciona». Politicamente condicionado, partidariamente manietado, Alegre procurou dar duas no cravo e uma na ferradura, fugindo aos problemas de fundo que o caso Face Oculta coloca – a este estilo de exercício do poder de Sócrates, ao PS como partido democrático e a si próprio como referência dos socialistas.
Não o choca o despudor da manipulação desmedida e controleira feita pela rede de figuras próximas do primeiro-ministro sobre empresários e meios de comunicação social? A desqualificação e a ausência de ética política dos boys colocados em postos decisores, com ordenados e mordomias escandalosos? A falta de vergonha de utilizar, comprovadamente, empresas públicas e com participações do Estado para beneficiar os meios de informação amigos e asfixiar financeiramente os órgãos de comunicação desalinhados? Pelos vistos, choca pouco.
Este estilo Chávez não lhe causa um sobressalto democrático? Não abala as suas convicções em defesa do livre pensamento e expressão de ideias? Não lhe provoca um assomo de revolta contra o controleirismo? Pelos vistos, não.
Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não. Se, até em ditadura, isso já era uma certeza, em democracia não é possível silenciar todos os que os discordam ou informam com liberdade e independência – por muitos boys e aparelhos de poder que se tenham ao serviço e à disposição.
É pena que Manuel Alegre não junte a sua voz aos que se demarcam desta vocação manipuladora e com tiques totalitários. Que não esteja do lado dos que resistem e dizem não. O seu passado cívico e político exigia-o. E a sua candidatura a Presidente da República não sairia tão manifestamente diminuída pelos seus silêncios, omissões e cumplicidades com estas práticas antidemocráticas.
«SOL» de 26 Fev 10