sábado, 7 de novembro de 2009

A crise – leonina

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Por Antunes Ferreira

BOM FIM-DE-SEMANA começou ontem. O Governo viu aprovado o seu Programa na Assembleia da República, ele próprio sem saber muito bem como isso terá acontecido. Mas aconteceu. No final de dois dias de debate do programa do Governo na Assembleia da República, José Sócrates afirmou que o Governo saiu dali «com uma investidura parlamentar e, portanto, tem legitimidade para iniciar funções. Este é o momento para começar a trabalhar e de dar ânimo, esperança, confiança aos portugueses no sentido de resolver a crise».

Entretanto, a Face Oculta continua o seu andamento em bom ritmo, muito se dizendo que é apenas a face emersa do icebergue e que estão para vir a público outros nomes sonantes de elementos ligados à actividade criminal. O próprio primeiro-ministro foi acusado, segundo o semanário Sol, de ter feito um telefonema para Armando Vara. Sócrates respondeu que era o que faltava ele não poder falar telefonicamente com um amigo e camarada de longos anos.

Nos Estados Unidos, um oficial psiquiatra do Exército norte-americano, o major Nidal Malik Hasn, de origem palestiniana protagonizou um verdadeiro banho de sangue, ao matar na maior base militar do Mundo, Fort Hood, treze pessoas e ferir outras 30, a tiros de rajada de duas pistolas- metralhadoras. Dizem testemunhas que o assassino teria gritado durante a matança Allah Akbar, Alá é Grande. Ainda nos States, um cidadão atirou a matar no centro da cidade de Orlando. Resultado: um morto e cinco feridos.

Volte-se a Portugal. Somos o número um na lista de infecções de VIH/sida entre os consumidores de drogas na Europa e aquele onde o número de mortes devido à droga mais subiu. Os dados de 2007 revelam um aumento de 45% na mortalidade, mas o Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência alerta que este número é "inflacionado" pelo método usado pelas autoridades para as calcular. E os valores reportam-se a 2007, dizendo as autoridades que no ano passado e já neste as coisas melhoraram.

Tanto se falou e fala e falará sobre a maldita crise e as desastrosas consequências que originou no País. É certo que ela se estende por todo o Mundo, mas, nós fincamos os pés na terra e repetimos até à exaustão – com o mal dos outros podemos nós bem. Porém, vendo bem as coisas, a verdadeira crise, a que não tem nem pode ter similares – lembram-se do anúncio? – é a do clube leonino.

Porque, de tudo o que enunciei, nada foi tão importante como o momento exaltado que se vive no Sporting Clube de Portugal. Isso sim, isso é a crise. A demissão do treinador Paulo Bento motivou inclusive conferência de imprensa com a participação do próprio e do presidente dos leões, José Eduardo Bettencourt. Mesmo sem se zangarem as comadres, descobriram-se algumas verdades. Tamanha foi a atenção ao acontecimento, que ele mereceu transmissão televisiva em directo.

E, pelos vistos, os Portugueses - ou seja, nós - dispensaram muito mais atenção a esta singular ocorrência do que a todas as restantes com que iniciei estas linhas. E ainda a procissão ia a sair do adro e já surdiam da toca mais dois abandonos: o de Pedro Barbosa, o antigo futebolista que era, agora, o Director Desportivo do clube, bem como o de Miguel Ribeiro Telles, vice-presidente da SAD leonina. Caiu o Carmo e a Trindade no complexo desportivo Alvalade Século XXI.

O futebol verde-e-branco estava em permanente tem-te-maria-não-caias. A cabeça de Bento – que parecia realmente estar fora do prazo de validade – era, no mínimo, o que se esperava, apesar do famigerado Bento «for ever» do presidente do Sporting. Mas, de imediato, apareceram as carpideiras calinas dos nossos funerais. Uns quantos colegas do auto-demitido vieram pressurosamente afirmar que os leões não faziam ideia do excelente treinador que tinham.

Este é o nosso Portugal, onde a hierarquia dos acontecimentos tem uma escala muito especial. Este é o nosso Portugal onde a inversão de valores é regra e, parece, a corrupção também é. Este é o nosso Portugal onde o princípio de Peter tem aplicação plena. Somos assim – e ninguém nos dá a volta – que nós não deixamos.