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Por José António Lima
SOBRE AS IMPLICAÇÕES políticas, partidárias e a nível do aparelho de Estado que o caso ‘Face Oculta’ levanta, Mário Soares veio a terreiro dizer aos portugueses: «Há uma coisa que, com a repetição sistemática, verdadeiramente me preocupa». O quê? A existência de redes tentaculares que alastraram impunemente e corrompem desde o funcionário mais baixo a quadros intermédios e de topo das empresas com cargos de nomeação pública? O facto de figuras conhecidas do seu PS aparecerem atoladas neste lodaçal de corrupção, tráfico de influências e subornos? A amostra do ponto a que se degradou a sua tão celebrada ética republicana?
Não, o que inquieta Mário Soares são «as informações que, em momentos políticos específicos, aparecem e são glosadas com bastantes pormenores nos jornais, rádios e televisões». O que desassossega o fundador do PS é «o segredo de Justiça, que é para ser respeitado e não pode ser infringido». Com dezena e meia de arguidos já constituídos no caso ‘Face Oculta’, Soares esperava que o processo se conseguisse manter longe do conhecimento público? Santa ingenuidade e caridosa preocupação – que não demonstrou, nem uma nem outra, em recentes processos, como os do BPN ou do BPP. Sintomaticamente.
Também o seu concorrente presidencial Manuel Alegre reagiu na mesma linha, sentenciando que as violações do segredo de Justiça são «o mais grave problema da democracia». Mas num segundo momento, percebendo a dimensão do que estava em causa, corrigiu o tiro e veio informar o país que está «muito incomodado e preocupado com tudo isto». Compreende-se porquê. E a inflexão.
Serão mais preocupantes para o país, para a sua democracia e a sua economia, as violações do segredo de Justiça ou a impunidade continuada e generalizada da corrupção – pequena, média e grande – que corrói e contamina os aparelhos da administração pública e do poder partidário, como se comprova nesta investigação ‘Face Oculta’?
Soares e Alegre deixaram bem claro para que lado vão as suas preocupações. Mais do que a gravidade e a ilicitude dos factos é a sua divulgação pública que os perturba. Parecem esquecer que o segredo de Justiça, mesmo não sendo violado, não garante o silêncio eterno. Tem um prazo limitado de duração, findo o qual os factos dos processos se tornam acessíveis ao conhecimento público. É uma questão de tempo. E de transparência democrática.
«SOL» de 13 Nov 09
Por José António Lima
SOBRE AS IMPLICAÇÕES políticas, partidárias e a nível do aparelho de Estado que o caso ‘Face Oculta’ levanta, Mário Soares veio a terreiro dizer aos portugueses: «Há uma coisa que, com a repetição sistemática, verdadeiramente me preocupa». O quê? A existência de redes tentaculares que alastraram impunemente e corrompem desde o funcionário mais baixo a quadros intermédios e de topo das empresas com cargos de nomeação pública? O facto de figuras conhecidas do seu PS aparecerem atoladas neste lodaçal de corrupção, tráfico de influências e subornos? A amostra do ponto a que se degradou a sua tão celebrada ética republicana?
Não, o que inquieta Mário Soares são «as informações que, em momentos políticos específicos, aparecem e são glosadas com bastantes pormenores nos jornais, rádios e televisões». O que desassossega o fundador do PS é «o segredo de Justiça, que é para ser respeitado e não pode ser infringido». Com dezena e meia de arguidos já constituídos no caso ‘Face Oculta’, Soares esperava que o processo se conseguisse manter longe do conhecimento público? Santa ingenuidade e caridosa preocupação – que não demonstrou, nem uma nem outra, em recentes processos, como os do BPN ou do BPP. Sintomaticamente.
Também o seu concorrente presidencial Manuel Alegre reagiu na mesma linha, sentenciando que as violações do segredo de Justiça são «o mais grave problema da democracia». Mas num segundo momento, percebendo a dimensão do que estava em causa, corrigiu o tiro e veio informar o país que está «muito incomodado e preocupado com tudo isto». Compreende-se porquê. E a inflexão.
Serão mais preocupantes para o país, para a sua democracia e a sua economia, as violações do segredo de Justiça ou a impunidade continuada e generalizada da corrupção – pequena, média e grande – que corrói e contamina os aparelhos da administração pública e do poder partidário, como se comprova nesta investigação ‘Face Oculta’?
Soares e Alegre deixaram bem claro para que lado vão as suas preocupações. Mais do que a gravidade e a ilicitude dos factos é a sua divulgação pública que os perturba. Parecem esquecer que o segredo de Justiça, mesmo não sendo violado, não garante o silêncio eterno. Tem um prazo limitado de duração, findo o qual os factos dos processos se tornam acessíveis ao conhecimento público. É uma questão de tempo. E de transparência democrática.
«SOL» de 13 Nov 09