Por Baptista-Bastos
PARECE QUE O MANUEL ALEGRE escreveu um artigo apelando ao despertar do PS. O artigo foi publicado num semanário que por aí se edita. Há anos, com um curto intervalo de duas semanas, em Outubro passado, que não frequento a distinta publicação. Socorro-me dos recortes de outros jornais para discretear, amenamente, sobre as apoquentações do meu velho amigo.
Não é aquele partido que tem de despertar. Já não há mal que lhe não venha, parafraseando o outro. É o País, somos todos nós, que temos de sacudir esta nefasta letargia. Permitimos tudo quanto nos tem acontecido. Em matéria política, como em matéria social, caracterizamo-nos por uma indiferença, uma total renúncia a pensar que nos torna fáceis títeres de gente sem escrúpulos. Éramos taciturnos; somos cabisbaixos. Portugal está "portugalizado", para recuperar, tristemente, o triste adjectivo com que Roger Vailland nos cauterizou no romance La Loi. Pior: subtraíram-nos a confiança, potenciando os nossos desgostos para uma deformidade que transformou as forças de cada um de nós numa agressividade fratricida.
Inculcaram-nos a ideia da inevitabilidade de um modelo e de um sistema, sem respeito pela diferença, desprezando o que pensamos, tripudiando sobre os nossos sonhos mais asseados. Não admitem a acção criadora em mulheres e homens sofredores. E, no entanto, é deste grupo vastíssimo que, tarde ou cedo, nascerão as soluções mais acertadas e os valores mais qualificados. Não se trata de uma questão de fé: é a razão da história que o explica e justifica.
Nenhum partido, nem um, sequer, é susceptível de se reformar por dentro. E a impossibilidade não incide, somente, nos partidos comunistas. O Manuel Alegre sabe, tão bem como eu, que está esgotado este arquétipo económico, condutor de crises e de tragédias, e protagonizado, em Portugal, pelo PS e pelo PSD, com os resultados conhecidos. Os remendos cerzidos por diligentes funcionários não autorizam a olhar o problema como assunto arrumado. Exactamente porque a sociedade, o movimento das ideias, as exigências históricas não constituem factores inanes. Embora não conheçamos a amplitude e a pertinência da crise, e a natureza profunda das suas repercussões, temos de recusar, em todas as circunstâncias, que só esta "alternância" é "alternativa". O carácter redutor desta concepção leva-nos, cada vez mais, a múltiplas incertezas.
As pequenas questões do PS e do PSD são minudências, cujas equações éticas roçam a mediocridade, e suscitam uma espessa indiferença geral. Pertencem à mesma galáxia, com os mesmos buracos negros. Incapazes de criar o imprevisto, estão suspensos nas flutuações dos mais obscuros compromissos.
«DN» de 15 de Julho de 2009
PARECE QUE O MANUEL ALEGRE escreveu um artigo apelando ao despertar do PS. O artigo foi publicado num semanário que por aí se edita. Há anos, com um curto intervalo de duas semanas, em Outubro passado, que não frequento a distinta publicação. Socorro-me dos recortes de outros jornais para discretear, amenamente, sobre as apoquentações do meu velho amigo.
Não é aquele partido que tem de despertar. Já não há mal que lhe não venha, parafraseando o outro. É o País, somos todos nós, que temos de sacudir esta nefasta letargia. Permitimos tudo quanto nos tem acontecido. Em matéria política, como em matéria social, caracterizamo-nos por uma indiferença, uma total renúncia a pensar que nos torna fáceis títeres de gente sem escrúpulos. Éramos taciturnos; somos cabisbaixos. Portugal está "portugalizado", para recuperar, tristemente, o triste adjectivo com que Roger Vailland nos cauterizou no romance La Loi. Pior: subtraíram-nos a confiança, potenciando os nossos desgostos para uma deformidade que transformou as forças de cada um de nós numa agressividade fratricida.
Inculcaram-nos a ideia da inevitabilidade de um modelo e de um sistema, sem respeito pela diferença, desprezando o que pensamos, tripudiando sobre os nossos sonhos mais asseados. Não admitem a acção criadora em mulheres e homens sofredores. E, no entanto, é deste grupo vastíssimo que, tarde ou cedo, nascerão as soluções mais acertadas e os valores mais qualificados. Não se trata de uma questão de fé: é a razão da história que o explica e justifica.
Nenhum partido, nem um, sequer, é susceptível de se reformar por dentro. E a impossibilidade não incide, somente, nos partidos comunistas. O Manuel Alegre sabe, tão bem como eu, que está esgotado este arquétipo económico, condutor de crises e de tragédias, e protagonizado, em Portugal, pelo PS e pelo PSD, com os resultados conhecidos. Os remendos cerzidos por diligentes funcionários não autorizam a olhar o problema como assunto arrumado. Exactamente porque a sociedade, o movimento das ideias, as exigências históricas não constituem factores inanes. Embora não conheçamos a amplitude e a pertinência da crise, e a natureza profunda das suas repercussões, temos de recusar, em todas as circunstâncias, que só esta "alternância" é "alternativa". O carácter redutor desta concepção leva-nos, cada vez mais, a múltiplas incertezas.
As pequenas questões do PS e do PSD são minudências, cujas equações éticas roçam a mediocridade, e suscitam uma espessa indiferença geral. Pertencem à mesma galáxia, com os mesmos buracos negros. Incapazes de criar o imprevisto, estão suspensos nas flutuações dos mais obscuros compromissos.
«DN» de 15 de Julho de 2009