domingo, 6 de dezembro de 2009

Independência?

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Por João Duque

Independência - subst. f.; estado qualidade de ser livre, de não depender de ninguém; qualidade do que tem autonomia política ("Kernerman Portuguese Learners Dictionary").

DEZASSETE ANOS acabados de fazer. Uma semana em Londres e a sensação de poder sair quando quisesse (todos os dias) para fazer o que quisesse (visitar museus e andar pela rua encantado com aquela sociedade) e entrar em casa quando me apetecesse (sempre cedo porque não havia dinheiro para copos ou noitadas).

Chegado a Lisboa comecei as guerrilhas em casa com a mãe e o pai. "- Onde vais?" "- O que é que isso interessa?" "- Mau!... Onde vais, com quem vais, e a que horas chegas?" "- Isso não interessa!" "- Ai não? Então vais ver como elas te mordem. Olha lá, como é que vais pagar o passe para andares por aí a vadiar?"...

Silêncio. Percebi onde queriam chegar. A minha revolta acabara ali. Tal como o gato de D.ª Sância, Mago, em "Os Bichos" de Miguel Torga, amoleci, "vendi-me", e anichei no humilhante recato da casa materna.

Afinal, cresci.

Portugal endivida-se todos os dias a uma escalada de verdadeiro desvaire. Se for verdade o que prevêem os economistas que acompanham a economia portuguesa nas várias agências internacionais, o défice público deve crescer à razão de 8% do PIB ao ano nos próximos três anos.

Se a essa dívida somarmos a que vai crescer à custa do endividamento de empresas públicas, municípios e demais entidades parapúblicas, a situação é um verdadeiro descalabro. A coisa este ano vai atirar para um endividamento público que sobe à razão de 1,7 milhões de euros à hora!

O ritmo a que esperamos que cresça a nossa economia é magro e insuficiente, pelo que o crescimento da taxa de juro, que vai seguramente começar em breve, irá rebentar com os cenários mais pessimistas dos orçamentos de estado.

Por outro lado, a baixa taxa de poupança nacional leva-nos a recorrer a sistematicamente a financiamento externo, o qual se mostra cada vez mais necessário, infelizmente para fazer face a financiamento de consumo em lugar de investimento, e com prazos cada vez mais curtos.

Perante este cenário está em causa a independência nacional. Em bem chegando ao limite que bem temo chegarmos em breve, as agências de rating vão tocar as campainhas. Ao mesmo tempo, o Banco Central Europeu vai começar a sua política de enxugamento da liquidez excessiva no sistema, o que vai aumentar significativamente o custo do crédito para quem tiver piores notações de rating. Os investidores internacionais que nos financiam vão exigir taxas de juro cada vez mais elevadas para fazer o mesmo tipo de financiamento que hoje nos concedem e vão exigir, pela lei do mercado, que o investimento público e privado seja realmente produtivo.

Se não vai a bem vai a mal. Ou ganhamos juízo ou o custo do capital público para Portugal passa a ser de tal forma elevado que os grandes investimentos públicos ficam escancaradamente negativos e já nem os generosos pressupostos dos estudos lhes vão valer.

Independência nacional? Só até D.ª Sância nos encher a malga com as inesquecíveis sopinhas de leite. Depois...

Expresso de 28 de Novembro de 2009