sexta-feira, 4 de junho de 2010

«Dito & Feito»

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Por José António Lima

MANUEL ALEGRE afirma estar contra os cortes do Governo nos subsídios de desemprego e que «teria sido preferível fazer cortes no desperdício» do aparelho de Estado. Mas, logo a seguir, acrescenta que é preciso aceitar o esforço de «consolidação orçamental» do Executivo socialista. Ou seja, Alegre tem o coração ao lado da esquerda que se manifesta nas ruas contra os pacotes de austeridade de Sócrates e a razão a dizer-lhe que «é muito difícil um candidato de esquerda ganhar uma eleição presidencial sem o apoio do PS», como reconheceu anteontem, na entrevista à RTP.

E este vai ser o drama que irá acompanhar e ensombrar dia a dia, ao longo dos próximos seis meses, a campanha de Alegre na corrida para Belém. Não é possível estar com um pé e o espírito na manifestação da CGTP, ao lado de Louçã e Jerónimo, e com o outro pé em S. Bento, ao lado de Sócrates, quando este acaba de aprovar o PEC-II com o PSD. Alegre não poderá, daqui a três ou quatro meses, estar solidário com a esquerda que faz uma greve geral contra os cortes nos salários e nas prestações sociais e, em simultâneo, manifestar igual solidariedade para com um primeiro-ministro que esteja a anunciar um inevitável PEC-III ou PEC-IV.

É um equilibrismo eleitoral insustentável para qualquer candidato. Que torna o objectivo de Alegre conseguir o pleno de votos da esquerda equivalente ao desígnio de fazer a quadratura do círculo na geometria presidencial.

Enredado nesta insanável contradição política, que divide e desmotiva a sua base de votantes, Alegre dificilmente duplicará a sua votação de 2006 e chegará aos 40%. Mesmo contando que o politicamente ingénuo Fernando Nobre chegue além de uns improváveis 3% (ainda assim, sempre ajudará a desviar alguns votos de Cavaco).

E é inútil Manuel Alegre desafiar Cavaco Silva, como fez na RTP, a antecipar a candidatura que já pré-anunciou para Setembro-Outubro. Não é fácil Cavaco mudar de ideias a convite de um seu adversário. Nem parece que sirva os seus interesses, eleitorais e políticos, alongar o tempo de campanha para atrapalhar uma eleição virtualmente ganha à partida.
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«SOL» de 4 Jun 10