quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Arsénico antigo envenena presente

Por Ferreira Fernandes

HÁ DIAS, contou o New York Times, abriram o sarcófago de Simão Bolívar, ao som do hino e em directo para a TV, no Panteão de Caracas. Como em tudo que é grandiloquente na Venezuela, Hugo Chávez estava por trás. Ele disse que urgia tirar a limpo a dúvida histórica: o pai da Pátria morreu de tuberculose ou envenenado?
Simão Bolívar (1783-1830), um filho de Caracas, foi personagem extraordinário, libertador da Venezuela e do Equador, 1.º Presidente da Colômbia, do Peru e da Bolívia. Chávez serve-se dele como uma marca, ao ponto de ter mudado o nome do país para República Bolivariana da Venezuela. Tem sido sina de Bolívar servir de bandeira a líderes pitorescos: Vicente Gómez, ditador entre 1908 e 1935, fez coincidir as suas datas de vida e de morte com as do El Libertador.
Mas estas pantominas ingénuas podem ter consequências graves: a confirmar-se o arsénico, as relações entre Caracas e Bogotá, que já são más, podem agravar-se. Porquê? Porque Bolívar morreu na Colômbia... A verdade histórica é que Bolívar fora expulso da Venezuela, exilou-se na Colômbia e o congresso venezuelano até cortou relações com os vizinhos por o ter acolhido, mas a história pode ser sempre refeita... Mas refeita porquê?
George Orwell, no livro 1984, explicou: "Quem controla o passado controla o futuro; quem controla o presente controla o passado." É essa a aposta de Chávez.
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«DN» de 5 Ago 10

NOTA (CMR): na foto: estátua de Bolívar na Av. da Liberdade, em Lisboa.