sábado, 22 de maio de 2010

Os ungidos

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Por João Duque

ESTAVAM OS FILHOS de Israel em fuga do Egipto acampados diante do mar, quando, "ao levantarem os olhos, viram os egípcios que vinham no seu encalço. Foram tomados de espanto e , clamando em alta voz, disseram a Moisés: 'Não havia, porventura, túmulos no Egipto, para que nos conduzisses a morrer no deserto?' Moisés respondeu ao povo: 'Não temais! Tende ânimo, e vereis a libertação que o Senhor vai operar hoje em vosso favor'. Moisés estendeu a mão sobre o mar. O Senhor fê-lo recuar com um vento impetuoso vindo do Oriente, que soprou toda a noite. E pôs o mar a seco. As águas dividiram-se e os israelitas desceram a pé enxuto no meio do mar, enquanto as águas formavam uma muralha à direita e à esquerda".

O que é que se paga a um gestor de topo? O tempo que passa em reuniões a dar ou a cercear a palavra aos presentes? A manter os trabalhos dentro da ordem? As horas dedicadas em representação da empresa em reuniões sociais?

Sim, também isto, mas muitos mais do que isto: paga-se a capacidade de ver mais longe do que os outros. Ver o que ninguém vê, o que não consegue, não quer ou tem falta de coragem para ver e implementar.

Paga-se a capacidade, o brilho, o magnetismo, ou carisma, que poucos têm e que, como que por milagre, parece concentrar-se num só. Ao líder paga-se o dever de estar sempre a pensar naquilo que a organização deve ser dentro de um, três ou cinco anos. Ao líder paga-se a 'cabeça no futuro'.

Eles são como que os ungidos por uma 'mão invisível', os escolhidos para liderar os outros. Estes aceitam-nos, elegem-nos e pedem-lhes rumos e orientações.

Não sei se os que me lêem, alguma vez estiveram sozinhos num gabinete a chefiar um grande colectivo de homens a quem se pediram rumos, orientações. 'E agora mestre? O que é que fazemos?' Esta é a pergunta mais difícil que se coloca a um homem, à qual todos os que estiveram nessa situação já algum dia responderam para os seus botões: "Não faço a mínima ideia!"

Mas os verdadeiros líderes são os que acabam, depois de reflectir, por encontrar a resposta. Conseguem formar as equipas, pô-las a trabalhar em harmonia, entusiasmar os outros no desempenho e fazem prevalecer os seus ideais sobre o mundo. Há outros que se metem na cama, acabrunham-se, ou erram desastradamente na implementação. Esses falham.

Qual deveria ser a remuneração de Moisés se fosse feita uma proposta à assembleia dos filhos de Israel em fuga do Egipto? Deveria remunerar-se a acção sobre as forças da natureza, que não foi, em verdade, sua? Ou a visão, a tenacidade e o cariz inigualável?

"Os egípcios os perseguiram: todos os cavalos do faraó, seus carros e seus cavaleiros internaram-se após eles no leito do mar. As águas voltaram e cobriram os carros, os cavaleiros e todo o exército do faraó que havia descido no mar no encalço dos israelitas. Não ficou um sequer".
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«Expresso» de 15 Mai 10