sexta-feira, 14 de maio de 2010

Pacto

.
Por João Paulo Guerra

NUM PAÍS EMBALADO pelo cantochão, os socialistas assinaram um pacto com “laranja”.

Mas o que os líderes do PS e do PSD acordaram não foi um pacto para a salvação da Pátria nem um acordo para o bem-estar dos portugueses. Foi simplesmente uma convenção pela sobrevivência de cada um deles. Isto é: por mais gravosas que sejam as medidas que em nome da crise, do défice, da austeridade venham a ser impostas aos portugueses, os dois mais volumosos partidos da alternância não apresentarão queixas um do outro ao eleitorado. Ora isto, que é apresentado pelos propagandistas como um consenso de responsabilidade e sentido de Estado, não passa de uma perversão da democracia, que deixa os eleitores sem apelo.

A democracia, para além do direito de intervenção, é fundamentalmente liberdade de informação, formação de opinião e consequente escolha. PS e PSD sugerem aos portugueses que, em vez de escolherem, atirem ao ar uma moeda em que caras e coroas estão ambas na mesma face. Com mais ou menos retórica e populismo, a política de apertar o cinto é idêntica e terá a bênção do outro lado da moeda. E assim, aos eleitores restará a única alternativa do voto de protesto, nos partidos marginais ao "centrão" ou em branco. O que, por enquanto, ainda constitui uma forma de intervir na composição do poder.

Porém, acresce a isto que até mesmo com o demagógico pretexto do corte das despesas do Estado se volta a falar na alteração das leis eleitorais com redução do número de deputados. As contas são fáceis de fazer: a redução do número de deputados abolia qualquer expressão política fora da coutada do "centrão". E então estaria instalado o absoluto situacionismo: a democracia dava lugar a uma união nacional de interesses em que só variavam as clientelas. E as moscas.

.
«DE» de 14 Mai 10