Por Rui Tavares
ISTO ACONTECEU em apenas uma semana.
Em Portugal temos um governo de bloco central. Na Europa temos um governo económico. Em ambos os casos são governos de facto e não de jure.
E agora, a ironia. Em Portugal, o governo de bloco central não manda, porque quem manda é Bruxelas. E em Bruxelas, o governo económico – aliás, antidemocrático e antifederal – também não manda, porque se limita a reagir “aos mercados”.
Estas duas notícias ainda há uns meses mudariam tudo. Agora são de uma absurda irrelevância. Tempos fascinantes.
Que crise é esta, em que todos ralham e todos parecem ter razão? É uma crise para os adversários da desregulação, e outra para os adversários do endividamento. Uma crise para os keynesianos e outra para os antikeynesianos. É uma crise feita de várias crises juntas. O seu nome é instabilidade.
O melhor economista da instabilidade que conhecemos era o americano Hyman Minsky, falecido em 1996, que se opunha em simultâneo à desregulação, à dívida, e à retração do governo. Na sua obra maior, publicada nos anos 70 e chamada Estabilizando uma economia instável, ele deixa algumas notas interessantes:
Primeira: a instabilidade faz parte da natureza do capitalismo. Segunda: a teoria económica convencional é um falhanço, na medida em que não toma a instabilidade como dado de partida, mas apenas como um acontecimento imprevisto a que é preciso “reagir”. Terceira: só é possível conter a instabilidade através de um redesenho político e institucional profundo. Quarta: em períodos de alta instabilidade safam-se melhor os países de “capitalismo de estado” (para o momento atual, esta é na mouche: China e Brasil). Quinta: o ênfase no setor financeiro em detrimento do emprego é um erro; uma sociedade com emprego acabará sempre por crescer.
Há outras ideias, mas estas já seriam suficientes para montar um embrião de estratégia. Numa fase em que, francamente, qualquer estratégia já deveria há muito ter saído da fase embrionária. Há dois anos que estamos em crise; há dois meses que estamos na crise da crise grega. Pelo menos desde então que deveria estar claro em todas as cabeças que a resposta teria de passar por Bruxelas. Não por ir de mão estendida a Bruxelas; mas por ter uma estratégia em Bruxelas, que fosse concertada com outros países, que fosse divulgada no Parlamento Europeu, que fosse se necessário enfiada pela garganta da Comissão Europeia. Que fosse de agir e não de reagir.
Se houve tal estratégia, ninguém no governo de Portugal se deu ao trabalho de informar. Nem, aliás, no governo grego, espanhol ou qualquer outro da União. O único embaixador em Bruxelas que se digna bater à porta do gabinete dos eurodeputados para lhes dizer o que pensa é – talvez vos surpreenda – o dos Estados Unidos da América.
Entretanto, em Portugal, espanta ver a pequenez do comentário na imprensa, aliás digno da pequenez da política, e centrado unicamente na verberação do defeitos atávicos da raça, como se o mundo tivesse algo que ver com eles. Os crepusculares cronistas do regime (Pulido, Pacheco, Sousa Tavares) são a prova impressa de que o desespero vende papel e que as longas jeremíadas pessimistas estimulam os centros de prazer do cérebro, que naqueles casos devem já estar hipertrofiados. Mas o problema do pessimismo nacional, como lembrava Manuel Laranjeira (em 1907!), é que o resto do cérebro coletivo atrofia se ninguém estiver interessado em olhar em torno e pensar em voz alta com os leitores.
.ISTO ACONTECEU em apenas uma semana.
Em Portugal temos um governo de bloco central. Na Europa temos um governo económico. Em ambos os casos são governos de facto e não de jure.
E agora, a ironia. Em Portugal, o governo de bloco central não manda, porque quem manda é Bruxelas. E em Bruxelas, o governo económico – aliás, antidemocrático e antifederal – também não manda, porque se limita a reagir “aos mercados”.
Estas duas notícias ainda há uns meses mudariam tudo. Agora são de uma absurda irrelevância. Tempos fascinantes.
Que crise é esta, em que todos ralham e todos parecem ter razão? É uma crise para os adversários da desregulação, e outra para os adversários do endividamento. Uma crise para os keynesianos e outra para os antikeynesianos. É uma crise feita de várias crises juntas. O seu nome é instabilidade.
O melhor economista da instabilidade que conhecemos era o americano Hyman Minsky, falecido em 1996, que se opunha em simultâneo à desregulação, à dívida, e à retração do governo. Na sua obra maior, publicada nos anos 70 e chamada Estabilizando uma economia instável, ele deixa algumas notas interessantes:
Primeira: a instabilidade faz parte da natureza do capitalismo. Segunda: a teoria económica convencional é um falhanço, na medida em que não toma a instabilidade como dado de partida, mas apenas como um acontecimento imprevisto a que é preciso “reagir”. Terceira: só é possível conter a instabilidade através de um redesenho político e institucional profundo. Quarta: em períodos de alta instabilidade safam-se melhor os países de “capitalismo de estado” (para o momento atual, esta é na mouche: China e Brasil). Quinta: o ênfase no setor financeiro em detrimento do emprego é um erro; uma sociedade com emprego acabará sempre por crescer.
Há outras ideias, mas estas já seriam suficientes para montar um embrião de estratégia. Numa fase em que, francamente, qualquer estratégia já deveria há muito ter saído da fase embrionária. Há dois anos que estamos em crise; há dois meses que estamos na crise da crise grega. Pelo menos desde então que deveria estar claro em todas as cabeças que a resposta teria de passar por Bruxelas. Não por ir de mão estendida a Bruxelas; mas por ter uma estratégia em Bruxelas, que fosse concertada com outros países, que fosse divulgada no Parlamento Europeu, que fosse se necessário enfiada pela garganta da Comissão Europeia. Que fosse de agir e não de reagir.
Se houve tal estratégia, ninguém no governo de Portugal se deu ao trabalho de informar. Nem, aliás, no governo grego, espanhol ou qualquer outro da União. O único embaixador em Bruxelas que se digna bater à porta do gabinete dos eurodeputados para lhes dizer o que pensa é – talvez vos surpreenda – o dos Estados Unidos da América.
Entretanto, em Portugal, espanta ver a pequenez do comentário na imprensa, aliás digno da pequenez da política, e centrado unicamente na verberação do defeitos atávicos da raça, como se o mundo tivesse algo que ver com eles. Os crepusculares cronistas do regime (Pulido, Pacheco, Sousa Tavares) são a prova impressa de que o desespero vende papel e que as longas jeremíadas pessimistas estimulam os centros de prazer do cérebro, que naqueles casos devem já estar hipertrofiados. Mas o problema do pessimismo nacional, como lembrava Manuel Laranjeira (em 1907!), é que o resto do cérebro coletivo atrofia se ninguém estiver interessado em olhar em torno e pensar em voz alta com os leitores.
In ruitavares.net/blog, 18 Mai 10