sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Jesus e as autárquicas


Por Antunes Ferreira
NUMA SEMANA em o Tribunal Constitucional deu mais uma machadada na credibilidade do (des)Governo considerando inconstitucionais seis normas propostas por São Bento para alterar a Lei do Trabalho;
Numa semana em que o porta-voz do PSD, Marco António Costa, considerou que seria encontrada uma solução que torne viáveis as normas do Código do Trabalho declaradas inconstitucionais, que assinalou terem sido aprovadas "sem terem o voto contra do PS";
Numa semana em que terminou a campanha eleitoral para as autárquicas que decorrem neste domingo, 29 de Setembro, e na qual esta deliberação do TC veio servir de arma de arremesso para a esquerda e para a direita, o assunto mais falado em Portugal foi a situação de Jorge Jesus, o treinador do Sport Lisboa e Benfica. Isto exemplifica bem o pensamento dominante da população portuguesa.
Uma esmagadora maioria dos cidadãos seguiu e segue e seguirá o evoluir da situação criada pelo técnico encarnado que no final do jogo no estádio D. Afonso Henrique, na cidade de Guimarães ao envolver-se num distúrbio resultante da entrada em campo de adeptos benfiquistas e que motivou a intervenção da PSP.
Como acontece sempre em desacatos com esta dimensão, cada parte arrogou a sua justificação para a desordem. A Polícia entendeu que o técnico do Benfica se portou mal, tendo agredido agentes da força pública e seguranças que tinham intervindo no que se passara. Jesus negou que assim tivesse sido, no que foi acompanhado pelo presidente do clube, Luís Filipe Vieira.
A PSP anunciou, entretanto, que iria interpor a acção que entende corresponder ao destempero do treinador junto dos tribunais competentes. O advogado do técnico declarou que o caso não passava de uma tempestade num copo de água, que o seu constituinte não agredira ninguém, obviamente polícias.
Porém, a situação complicou-se com a entrada em cena da Federação Portuguesa de Futebol, através do seu Conselho de Disciplina ter ordenado a instauração de um inquérito disciplinar a Jorge Jesus, pelo episódio ocorrido em Guimarães. Este seguiu, em conformidade, para a Comissão de Instrução e Inquéritos (CII) da Liga Profissional.
Esta última também abriu de abriu de imediato processos disciplinares a todos os envolvidos nos incidentes, nomeadamente ao treinador do Benfica, à equipa de arbitragem (liderada por Bruno Esteves e composta ainda por Mário Dionísio, Rui Teixeira e Manuel Oliveira) e aos delegados da Liga (Paulino Carvalho e Carlos Santos).

Se em relação a Jorge Jesus o procedimento surgiu com naturalidade, dado que já era esperado, não deixa de causar estranheza que também árbitros e delegados estejam sob a alçada disciplinar. Segundo a Lusa, tal deve-se ao facto de a CII da Liga entender que existem indícios de omissão do dever de informação nos respetivos relatórios.
A decisão da Comissão de Instrução e Inquéritos foi tomada com base nos relatórios da PSP e dos delegados, e fundamentalmente através das imagens televisivas dos incidentes. E aqui o principal problema que pode complicar a vida de Jorge Jesus resulta das cenas capturadas pelas câmaras das televisões. Mais ainda: as redes sociais encarregaram-se de passar essas imagens que, desta forma, se espalharam pelo Mundo.
O próximo passo para o apuramento de responsabilidades, ao nível da justiça desportiva, é chamar todos os intervenientes e testemunhas para prestarem declarações. Caso seja provada a agressão, o que é o pior dos cenários em termos disciplinares, Jorge Jesus será suspenso entre três meses e três anos.
Estão, pois, reunidos os ingredientes para se cozinhar um prato altamente picante e, até, tóxico. Os Portugueses, que pouca atenção dispensaram à campanha eleitoral, viraram-se para este tema escaldante. No fundo, estão nas tintas para a política e voltaram-se, como habitualmente para o futebol.
Há muito que esta atenção se verifica a nível da população. Recordo que no tempo do salazarismo existiu um ditado elucidativo: “Quem não é do Benfica não é bom chefe de família”. Complementado de resto por outro slogan cabotino: “A minha política é o trabalho!”
Tal como nas primeiras telenovelas apresentadas na RTP, já lá vão uns bons anos se informava que eram apresentados de seguida “cenas do próximo episódio” Ora este “importantíssimo assunto “ leva ao desencanto quanto às eleições para as autarquias, em detrimento do caricato “Processo Jesus”.
Vamos ver no que isto dá: em primeiro lugar este último; depois, os resultados dos votos introduzidos nas urnas. Já o Estado Novo defendia que em Portugal havia a trilogia dos três F: Fátima, futebol e Fado. Mas o fado que vivemos não é apenas triste: é catastrófico.


domingo, 22 de setembro de 2013

O fim do Mundo e o cozido à portuguesa

Por Antunes Ferreira
OS HUMANOS - com as características que hoje temos - sempre se preocuparam com o fim do Mundo e muitos dentre eles previram e anunciaram como isso ia acontecer e, sobretudo, quando. Essas “profecias” continuamente indicaram a data fatal e fizeram-no para que a Humanidade se preparasse a fim de se precaver contra o cataclismo universal.
Aproveitando mais um falhanço da “previsão” do pastor protestante Harold Camping, que pela segunda vez pressagiava o dia da ocorrência final, a Times publicou em 2011 um curioso trabalho em que alinhavava as dez mais importantes conjecturas alinhadas ao longo da História. Trabalho complexo, simultamente de compilação e de motivo de ironia.
É dele que respigo uns quantos apontamentos, não pretendendo que sejam lidos como um suposto tratado sobre a matéria. Se o tentasse fazer morreria de exaustão, naturalmente antes do fim do Mundo. Na verdade e retomando os “cálculos “de Camping, em 1992 ele anunciara que dois anos depois, ou seja em meados de Setembro de 1994 estaríamos todos no Paraíso ou no Inferno… Penso, no entanto, que nessa data ainda existia o Purgatório e por isso ele também poderia ser o último apeadeiro do comboio do nosso planeta azul.
Face ao desabar da congeminação, ele não descansou e voltou à carga em 2011, desta feita garantindo que não se enganava na data do apocalipse final: 12 de Dezembro de 2012. O diabo é também a decepção foi total. Perante esta segunda “desgraça” o futurólogo decidiu aposentar-se da sua função de anunciador do tal fim e dedicar-se a obras de benemerência ou, quiçá, à pesca, de acordo com fontes idóneas e bem informadas.
 Mas já no século XIX um outro pastor norte-americano,  William Miller, a quem a Time chamou "provavelmente o mais famoso falso profeta da história", se dedicara a essa tarefa, verdadeira terapêutica ocupacional. Ele começou a pregar o fim do Mundo no começo da década de 1840, dizendo que Jesus retornaria à Terra e o planeta arderia em fogo em alguma data entre 21 de Março de 1843 e 21 de Março de 1844. Naufragou.

Faça-se uma tangente pelo mais do que famoso bug dos milénios: na passagem de 1992 para 2000 os computadores soltariam o seu último clique e os homens não poderiam fazer mais do que resignar-se e preparar-se para o Big Bang do fim do tempo. Outra presciência, outra desilusão. O ano de 2000 entrou decidido a dar cabo da antevisão. Nada feito. E até os Maias…

Mas, a que vem este arrazoado?

O fim da Humanidade está em contagem decrescente, revelou há dias um estudo britânico que esclarece que o planeta Terra só será habitável nos próximos 2 350 milhões de anos. Já não é mau. A mim não tira o sono…O cálculo é de investigadores da Universidade de East Anglia, no Reino Unido e foi publicado na revista Astrobiology. Nele, os cientistas explicam que a Terra deverá entrar na zona quente do Sol, acabando assim com as condições de habitabilidade do planeta, uma vez que os oceanos se devem evaporar.

«Haverá uma extinção catastrófica e terminal para toda a vida», disse o diretor do estudo, Andre Rushby, citado pelo Daily Mail. Porém, alertam ainda, o planeta pode deixar de ser habitável antes, daqui a 1 750 milhões de anos, uma vez que o estudo determina que a entrada na zona quente do Sol deve acontecer entre as duas datas milionárias- de anos.
Vá lá acreditar-se em prescientes. É que agora a roca fia mais fino. Não se trata de mais uns aldrabões; são cientistas, ainda que com uns laivos de Nostradamus. Eles não brincam e usaram os mais sofisticados meios para chegarem a uma tal conclusão. Mas, com esta mania de não confiar em ninguém, sequer mesmo da própria sombra, permito-me ter as minhas dúvidas.
Repare-se: eles não afirmam concludentemente que a desgraça acontecerá pelas 19:46 do dia 18 de Março do ano de 235000000. Nada disso: ficam-se por uma indecisão de 600 milhões de anos. Não se faz; mas pergunto: então a ciência não é exacta? Sempre me disseram que sim e eu, ainda que um tanto com um pé atrás, acreditei piamente. E agora, que fazer?
Para já – e escrevo no dia do meu aniversário, 20 de Setembro - não vou marcar nada na minha agenda entre 2350 e 1750 milhões de anos. E embora já o tivesse apontado, nem um cozido à portuguesa.

domingo, 15 de setembro de 2013

Uma lei imoral

Por Antunes Ferreira
COMO DIZEM os Brasileiros - no que respeita à lei que estabelece a convergência das pensões entre o sector público e o sector privado, e que reduz 10% as pensões dos reformados do Estado de valor superior a 600 euros - a coisa está preta. E está. A antiga líder do PSD, e ministra das Finanças e da Educação do Governo chefiado por Cavaco Silva, afirmou no seu comentário habitual no programa Política Mesmo da TVI24 que essa lei é “imoral”.

O (des)Governo chefiado (???) por Passos Coelho avançou com esta medida e muita gente interpretou-a como se ela fosse uma vingança contra o Tribunal Constitucional. De que o (des)Executivo não gosta e Coelho ainda muito menos. Vejam-se os comentários infelizes por ele proferidos no encerramento da Universidade de Verão dos ditos sociais-democratas. Que, de resto, não foram refutadas, nem sequer contestadas.

Pode-se referir que Manuela Ferreira Leite estará a tentar recuperar o facto de ter perdido a liderança laranja justamente contra Passos. A ser assim, bem podemos estar a assistir a passos de dança, onde um parceiro da mesma cor tenta desforrar-se do outro, no caso presente, uma parceira a tentar dar cabo do outro.

Ferreira Leite usou uma linguagem muito dura e cáustica ao referir-se ao assunto, chegando mesmo a dizer que se trata de socializar a classe dos reformados do Estado, deixando uma conclusão acérrima: para ela é uma medida que um  qualquer Governo Comunista não enjeitaria. Mas a economista não se coibiu de acusar quem produziu a lei, afirmando que ela, a lei aprovada na última quinta-feira em Conselho de Ministros  “antes de ser constitucional ou não ser constitucional (…) no ponto fundamental é profundamente imoral. E na política, como na vida, nós, a despeito dos objectivos, temos de olhar aos meios que utilizamos para atingir esses objectivos”.

A antiga presidente do PSD falou mesmo em “leviandade, ligeireza e superficialidade” como esta matéria está a ser encarada pelo (des)Governo, - o parênteses, como sempre, é meu - fazendo ressaltar que o diploma “Agride uns princípios tão fundamentais e tão básicos do que é a relação entre as pessoas, do que é a construção de vida das pessoas, do que é o drama que implica nas pessoas, que não creio que haja o direito de ele ser aplicado sem ser com uma profunda ponderação que deve envolver as forças vivas deste país”.
Mas foi ainda mais longe considerando ainda uma “brincadeira de mau gosto” que esta medida seja apresentada pelo Governo como temporária enquanto o país estiver em crise porque os objectivos do Governo não serão atingidos”. “O único objectivo disto é transmitir ao Tribunal Constitucional que esta é uma medida temporária e não definitiva. Não sei quem acredita nisto”.
Ferreira Leite prevê também que dentro de algum tempo o Governo apresente cortes nas reformas que vão atingir todos e não apenas os aposentados da função pública. “Esta medida é um teste a pessoas que não fazem greve, que não têm representação na concertação social, que não têm nenhuma legislação que os proteja. Mas é evidente que isto não resolve nenhuma reforma orçamental”.
Basta de citações. O ditado que diz que “com amigos destes mais vale ter inimigos” tem aqui plena validade; outro rifão afirma que “zangam-se as comadres descobrem-se as verdades”. Coelho e os seus asseclas estão uma vez mais confrontados com uma castanha que lhes pode explodir nas bocas. E, ainda por cima, daquelas que não se podem tirar das brasas.

Porém, infelizmente, tudo indica que o poder já se habituou a tentar todos os golpes para dar cabo dos cidadãos, começando pelos trabalhadores da Função Pública até chegar aos das empresas privadas. O que quer dizer que é necessário estarmos todos preparados para o que pode ocorrer – e que é plausível que a todos nós, Portugueses, nos bata à porta.  

Que fazer, então? Sendo profundamente pacifista, não descarto a hipótese de aparecer por aí um Buiça ou mais, que comecem a sua tarefa em Belém e a acabem em São Bento, passando por outros locais onde existam (des)governantes. Infelizmente, se tal acontecer, poderemos ter uma guerra civil. Mas também há quem diga que estamos tão mal que esse seria o menor.

Nós, os Portugueses, somos uns sujeitos que no entender do falecido Padre Américo se enquadram no que disse: “não há rapazes maus”. O problema é que logo acrescentaram (e perdoe-se-me o vernáculo): “mas há por aí uns quantos filhos da puta”.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Lázaro ressuscitado


Por Antunes Ferreira
SINÓNIMO de bom orador na língua portuguesa é António Vieira, ou para ser mais preciso, o padre António Vieira. São mais de 500 os seus sermões, dos quais o Mais conhecido é, indiscutivelmente, o de Santo António aos Peixes. A oratória foi pelos séculos XV, XVI, XVII e XVIII, praticada pelos sacerdotes do alto dos seus púlpitos.

Já na Antiguidade a fama de Demóstenes em Atenas e de Cícero em Roma na arte de bem falar, perdurou por séculos e séculos e ainda hoje se refere que o grego, gago de nascença, usou para corrigir a dicção, falando com seixos na boca; isto durante uns anos até se tornar o orador que assim entrou na História Universal.

Por seu turno, o romano ficou célebre pelos seus discursos entre os quais se destacam as catilinárias, feitos no Senado de Roma e perante o povo, contra Catilina, um nobre que tentava destruir as instituições republicanas. Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra? Até quando, enfim, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? A frase continua e continuará a ser usada.

O padre Teodósio, Teodósio de Jesus Pimenta, nascera com o dom da palavra. Nascera, crescera e chegara a sacerdote empunhando a oratória como arma de arremesso contra o demo e seus seguidores, em nome de Cristo ainda que não se saiba se este lhe terá passado procuração para o efeito. Afastem-se minudências sem grande valor.

Todos os Domingos saía sermão, sem falha, sem hiatos, persistente, pontual e verdadeiro. Pastoreava uma freguesia, onde vivia com sua irmã Celestina. Diziam as más línguas que era apenas uma justificação perante o mundo, pois que Teodósio e Celestina partilhavam a mesma cama. Adiante; línguas viperinas.

Pois numa manhã de Domingo, Teodósio acordou rouco. Rouco? Rouquíssimo. E o sermão? Nisto meditava quando se dirigia à igreja paroquial e por isso disse com decibéis negativos ao sacristão Jaquim. Como iria ser? Ninguém o entenderia com aquele falar roufenho. Uma desgraça!

Jaquim atalhou a desdita: Padre Teodósio, hoje é a homilia sobre o Lázaro e eu já o ouvi tantas vezes que a sei de cor e salteado. Vou eu para o púlpito e digo-a ao seu rebanho. Nem pensar, tu és um desbocado, nem que lavasses a boca vinte vezes em água benta deixarias de o ser. Nada, padre; eu subo e o senhor fica cá em baixo e no caso de alguma derrapagem avisa-me e eu corrijo.

E assim foi, ainda que o bom clérigo desconfiasse do que poderia acontecer; atento, foi ouvindo. Lá em cima, o Jaquim começava: Voltara o tipo à Judeia e padre Teotónio dirigindo-se ao sacristão: é Jesus, Nosso Senhor. E o orador, pois meus irmãos, enganei-me: voltara Jesus Nosso Senhor à Judeia e ao chegar a Betânia vieram umas gajas aos gritos

Não são gajas! São santas mulheres, entre as quais Marta a irmã do falecido que informou o Senhor da morte de Lázaro, sepultado já há quatro dias e o sacristão emendou, ipsis verbis, prosseguindo: só tu, Senhor o podereis ressuscitar. Então as santas mulheres conduziram Jesus Cristo, à tumba de Lázaro. Ali chegados

O eclesiástico pensou de si para si, o Jaquim entrou nos eixos. Safa! O dito cujo prosseguiu: O filho de Deus impôs as mãos e disse Lázaro levanta-te e anda. E o ressuscitado levantou-se e andeu. Teodósio quase perdeu o tino e, regougou para cima: é andou, estúpido, é andou, estúpido. O sacristão; pois andou estúpido durante três dias e depois passou-lhe