sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Os velhos

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Por Maria Filomena Mónica

NA ÚLTIMA SEGUNDA-FEIRA [Jun 2008], teve lugar na Fundação Gulbenkian um «fórum» dedicado ao tema «Como se envelhece em Portugal». A este propósito, lembrei-me de um poema de Jacques Brel, com um título idêntico ao que usei neste artigo, no qual que se diz: «Les vieux ne bougent plus leurs gestes ont trop de rides leur monde est trop petit/ Du lit à la fenêtre, puis du lit au fauteuil e puis du lit au lit». O casal, resignado e doce, aqui celebrado desapareceu do mundo contemporâneo. Há alguns anos, costumava brincar com o Miguel Esteves Cardoso sobre as delícias do envelhecimento: ser gágá dar-nos-ia a liberdade de poder dizer tudo o que nos passasse pela cabeça; entre as cadeiras de rodas a risota seria permanente; ninguém nos poderia interditar as piores asneiras. Nunca mais com ele falei sobre o assunto. No que me diz respeito, esta visão idílica desapareceu.

O futuro dos velhos é tenebroso, especialmente o das mulheres, com uma esperança de via mais longa do que a dos homens. Já nem falo dos pobres, para quem tudo é mais difícil, mas, mesmo para os ricos, as perspectivas não são risonhas. A ideia corrente de que apenas nos «lares» são os velhos mal tratados é errada. A maior parte da violência passa-se, sempre se passou, no interior da família, como recentemente lembrou o Provedor Geral da República, que nos veio alertar para um facto dramático: de 2001 a 2006, o número de crimes denunciados, em que a vítima tinha mais de 64 anos, triplicou, atingindo, na última data, 24.879 casos. Não nos podemos esquecer que são pessoas como nós, com vidas aparentemente normais e almas sensíveis, que espancam os pais e avós. Este tipo de brutalidade revela quão pesado é tratar de velhos em condições cada vez mais deterioradas. É por isso que não quero depender dos filhos, nem ir para um lar. A única solução é morrer, em data não muito longínqua, com um ataque de coração.

Junho de 2008