terça-feira, 13 de abril de 2010

Aprender a copiar

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Por Nuno Crato

A REVISTA SCIENCE desta semana publica um artigo sobre as estratégias de imitação. O tema é surpreendente, pois estamos habituados a pensar nos seres humanos como imaginativos, criadores e pouco propensos à cópia. Ouvimos dizer que o ensino não deve incentivar a recepção acrítica de informação e que os alunos devem, pelo contrário, ser criadores e “desenvolver competências” de “aprender a aprender”. Quem esteja habituado a estas ideias românticas ficará certamente surpreendido com os resultados da moderna psicologia cognitiva e com o que se tem descoberto sobre o comportamento humano e animal e a cooperação nas sociedades.

Já temos discutido o problema nesta coluna. Em tempos, falámos de um estudo em que Andrew Whiten e outros cientistas estudaram a transmissão de práticas em chimpanzés (Nature 437, pp.737–40). Os investigadores revelaram a tendência destes primatas a manterem atitudes conformes a uma prática maioritária, mesmo quando ela não é a mais eficaz, e chegaram à conclusão que a conformidade com o grupo se sobrepunha à facilidade de conseguir satisfazer um objectivo imediato, como o de obter alimento. A afinidade cultural, sublinharam, é pois importante para os macacos e não apenas para os humanos.

Num outro artigo publicado na revista Animal Cognition (8, pp. 164–81), Victoria Horner e o mesmo Andrew Whiten levaram as experiências mais longe, comparando o comportamento de chimpanzés com o de humanos. Surpreendentemente, os humanos são mais propensos à imitação que os macacos; imitam melhor e prezam mais a conformidade com o grupo.

Derek Lyons e outros investigadores da Universidade de Yale confirmam a muito maior propensão dos humanos para imitar comportamentos, mesmo quando eles são inúteis. Essa maior capacidade de imitação ter-nos-á dado uma grande vantagem na batalha colectiva pela sobrevivência. Lyons, um psicólogo cognitivo, tem transposto as suas descobertas para a pedagogia e tem concebido processos de ensino em que os alunos procuram colectivamente a imitação de procedimentos.

Todos estes cientistas se referem ao trabalho pioneiro de Robert Axelrod, um norte-americano que estudou matemática e ciência política e se dedicou depois à investigação teórica da concorrência e competição sociais. Num artigo célebre publicado na Science em 1981 em co-autoria com o biólogo evolucionista William D. Hamilton (211, pp. 1390–6), Axelrod inventou uma experiência que mostrou como a cooperação entre organismos, sejam bactérias ou primatas, pode ocorrer baseada na reciprocidade e pode evoluir para uma estratégia espontânea estável, que defende a comunidade de perigos externos.

O estudo agora publicado na Science inspira-se nestas experiências. Luke Rendell e seus co-autores conceberam uma experiência em computador em que os diversos participantes têm à sua disposição três estratégias diferentes: «inovar» (um método de tentativa e erro), «observar» e «avançar» (única maneira de obter uma recompensa). A estratégia vencedora foi a que se baseou exclusivamente na aprendizagem social. Copiar o que os outros fazem evita os esforços e riscos da aprendizagem pela descoberta. É claro que inovar também é necessário. Mas a experiência esta semana relatada na Science confirma o que muitos investigadores já tinham dito. A aprendizagem com os outros é o segredo da nossa evolução social. As estratégias inovadoras só muito raramente têm sucesso.

«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 10 Abr 10