sábado, 24 de abril de 2010

Experimente o seu milagre na Terra Santa

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Por Antunes Ferreira

NÃO TENHAMOS dúvidas, homens de pouca fé; é assim mesmo, sem tirar nem pôr. Enquanto há vida, há esperança, isto porque esta é sempre a última a morrer. Aforismos com carradas de razão – eles têm-na sempre. Mas, quem são eles? Passo a explicar, para depois tirar as conclusões que aliás são evidentes. E a sugerir ao Ministro das Finanças que atente nesta excepcional proposta.

A caixa do correio é imprescindível mas é muito perigosa. Nesta semana que passou, ela acolheu uma coisa impressa cujo título é Folha de Portugal. Tratamento privilegiado tem, já que a Dica e outros órgãos de comunicação e impressos, são colocados obrigatoriamente em cima da secretária do Sr. Eduardo Sequeira, o porteiro do prédio, que fiscaliza absoluta e cuidadosamente esse procedimento. Aqui para nós, o Sr. Sequeira é um gajo porreiro.

Esta folha é, portanto, uma excepção, para ser mais correcto a excepção. Talvez porque no título ostente na orelha direita um «sempre ao seu lado», que conforta e informa o pessoal que não há que ter incerteza, qualquer ela que surja ou mesmo que seja. Lembrou-me o «sempre, sempre ao lado do Povo», mas este era do MFA que, não sei se sabem ou se recordam era o Movimento das Forças Armadas que fez o 25 de Abril.

Nada disso, lagarto, lagarto, lagarto, t’arrenego Satanás. Esta folha semanal, com a tiragem de 50.000 exemplares de distribuição gratuita é da IURD, a Igreja Universal do Reino de Deus, com sede ali na Alameda D. Afonso Henriques, no prédio que foi o falecido cinema Império. Comandada pelo Bp, que não é a gasolineira, mas sim Bispo pastor Edir Macedo.

Nas 20 páginas que possui, o semanário – que também tem um suplemento com mais oito, o caderno Folha Centro de Ajuda Espiritual, CdeAE – podem ler-se as 39 situações em que não é cobrado nada. Grátis. Mas, lá está igualmente que «Só ensina às pessoas a VERDADE. O dízimo, como também as ofertas, são mandamentos bíblicos». Ali não se engana ninguém. Nova recordação me assalta a mente ímpia. Os da banha-de-cobra também não.

E, para que não subsistam interrogações, traz uma entrevista com Cláudia Nunes, que vive em Oliveira do Hospital, e era possuidora de vários quistos de grandes dimensões. Apesar do «intenso tratamento» (os termos vêm lá), «…as dores eram cada vez maiores» e só havia uma solução de acordo com a médica dela: «retirar o ovário».

Mas, felizmente, ela foi ao CdeAE onde «clamou a Deus para acontecer um milagre». Até entrou na «Fogueira Santa» e deu «tudo o que Deus me tinha pedido. Sacrifiquei com a certeza de que ia obter o milagre que precisava, assim coloquei no Altar todo o dinheiro que tinha juntado durante três anos». Resultado: os quistos desapareceram todos, facto comprovado pela sua médica.

Um outro depoimento, desta feita da Emília, hoje empresária com a ajuda do CdeAE. Era costureira, ganhava uma miséria «até que, um dia, o pastor estava a pregar e perguntou quem é que tinha coragem de dar o seu tudo para que a situação se resolvesse». Tinha vindo do armazém, onde recebera a féria «e mesmo tendo as contas para pagar (…) decidi dar o meu tudo». E como pedira para ser empresária, hoje é. Entregando de novo o seu tudo.

Face a isto, não admira que o anúncio de uma página afirme expressamente e em letras gordas EXPERIMENTE O SEU MILAGRE NA TERRA SANTA, a partir de 1.600 euros.

O ministro Teixeira dos Santos deveria inscrever-se já e ir e experimentar o seu milagre, numa excursão que decorrerá entre 13 e 20 de Agosto. Talvez um pouco tardia para encontrar o milagre de pôr em ordem as finanças e a economia do País. Mas, mais vale tarde do que nunca. FMI, comentadores, opinion makers, especialistas e outros render-se-ão. O CdeAE não falha; é tiro e queda.
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NOTA (CMR): Cartoon publicado com autorização do autor - http://karikamania.no.sapo.pt