sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Causa Pia

.
Por João Paulo Guerra

O CHAMADO processo Casa Pia chega hoje não ao fim mas, quando muito, ao início de uma nova fase que ameaça ser tão delongada como a que ficou para trás.

O processo em julgamento leva oito anos mas em Portugal não se faz justiça: vai-se fazendo uma coisa vagamente parecida. Entretanto, as vítimas não deixaram de ser vítimas, embora aviltantemente ressarcidas em metal sonante, enquanto os arguidos passaram à categoria de condenados no inquisitório tribunal da opinião pública. A justiça em Portugal admite e permite tudo isto.

Ao fim de oito anos de desenvolvimento do processo persistem alguns mistérios na investigação do hediondo crime da pedofilia em Portugal. O primeiro, que nasce com o próprio processo, é o mistério dos nomes, referidos quer por alegadas vítimas quer por supostas testemunhas, que jamais foram investigados. O facto fez e faz pairar dúvidas de encobrimento desde o início sobre o processo. A investigação definiu um ‘casting' de discretos arguidos, apenas com um mediático cabeça de cartaz, e ficou por aí. E assim, ao contrário de todos os demais países onde se revelaram e investigaram casos de pedofilia, em Portugal não há no leque dos acusados representantes de sectores da sociedade como sejam a política, a magistratura, a religião. Ao mesmo tempo, uma simples suspeita, não confirmada em acusação, permitiu a decapitação do que à época era o principal partido da oposição.

Na politização do processo cruzam-se todos os mistérios e movimentam-se todas as figuras que de um dia para o outro descobriram esta causa pia e se graduaram em grandes arautos da defesa das vítimas, passando a colaborar decisivamente com a investigação policial.

Esta sexta-feira começa nova fase do caso. Mas há dúvidas que jamais transitarão em julgado.
.
«DE» de 3 Set 10