terça-feira, 7 de outubro de 2008

Não é normal...

.
Por Nuno Crato
.
NÃO, OS MERCADOS FINANCEIROS não são normais. Muito longe disso. Têm um comportamento bastante excêntrico — ao qual, aliás, já devíamos estar habituados. Ou seja, deveríamos achar normal observar resultados dramáticos.
.
O melhor é explicarmo-nos. Se lançarmos uma moeda equilibrada ao ar e registarmos ‘zero’ sempre que sair caras e ‘um’ sempre que sair coroas, estamos a fazer uma experiência aleatória em que cada um dos números ‘zero’ e ‘um’ aparecem com probabilidade 1/2. Estas probabilidades, 1/2 para zero e 1/2 para um, determinam completamente a chamada distribuição de probabilidade associada a essa experiência. E essa distribuição particular tem um nome, diz-se que é uma distribuição de Bernoulli.
.
Há muitas outras distribuições de probabilidades associadas a experiências aleatórias. Uma das mais estudadas é a distribuição de probabilidades normal, ou de Gauss, que é bem conhecida visualmente pela sua forma gráfica de sino com abas. Quem estuda um pouco de probabilidades habitua-se a ver tão frequentemente esta distribuição de que percebe o nome «normal» que se lhe dá. Mas este nome é enganador, pois há situações em que não é natural nem possível usar a distribuição de Gauss.
.
Em Educação têm surgido muitas confusões derivadas ao duplo sentido deste nome. Há técnicos que olham para os resultados dos exames e acham que «não são normais». Fica-se sem perceber o que querem dizer. Será que os resultados não são razoáveis ou será que não seguem a distribuição de Gauss, com as nota acumuladas em torno de valores médios e dispersas simetricamente para os lados, tantas abaixo como acima da média?
.
O passo seguinte ao lamento da anormalidade é tornar os resultados «normais», ou seja, manipulá-los para que sigam a distribuição de Gauss. Lamentável! Não há nada definitivo em psicometria nem em teoria da avaliação educativa a favor da distribuição de Gauss. Tal como no caso da moeda ao ar, não é anormal encontrar uma distribuição diferente da normal.
.
Coisa semelhante se passa nos mercados financeiros, que têm constituído uma das áreas mais estudadas em probabilidades e estatística. Há várias décadas o matemático Benoit Mandelbrot, conhecido como teórico da geometria fractal, estudou as variações dos preços do mercado do algodão e concluiu que estas incluíam uma componente aleatória que não seguia a distribuição de Gauss. Propôs uma distribuição diferente para modelar as oscilações dos preços. Essa distribuição tem uma peculiaridade curiosa: a probabilidade de se registarem eventos extremos é relativamente elevada, muito mais elevada do que no caso da distribuição de Gauss.
.
Coisa semelhante se passa nos mercados financeiros, que têm constituído uma das áreas mais estudadas em probabilidades e estatística. Há várias décadas o matemático Benoit Mandelbrot, conhecido como teórico da geometria fractal, estudou as variações dos preços de mercado do algodão e concluiu que estas incluíam uma componente aleatória que não seguia a distribuição de Gauss. Propôs uma distribuição diferente para modelar as oscilações dos preços. Essa distribuição tem uma característica importante: a probabilidade de se registarem eventos extremos é relativamente elevada, mais do que no caso da distribuição de Gauss.
.
O que se passou com a crise de liquidez de instituições financeiras foi, segundo muitos, uma confirmação dessa descoberta. Os preços podem ter uma variação contida durante longos períodos — terem uma fraca volatilidade — e terem depois variações muito acentuadas — grande volatilidade. Tudo isso é difícil de prever. Mas, volta e meia, por vezes com décadas de intervalo, os mercados têm variações extremas, que mostram que a distribuição de Gauss não fornece um modelo adequado para as variações das bolsas. É curioso que tenha sido um matemático a descobri-lo.
.
«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 4 de Outubro de 2008 (adapt.)
NOTA: Este post é uma extensão do que está afixado no Sorumbático [v. aqui], onde os eventuais comentários deverão ser afixados.