sábado, 14 de agosto de 2010

Bebé vale nove milhões

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Por Antunes Ferreira

BEBÉ torna-se notícia. Com direito a cabeçalhos, páginas inteiras, lugares de destaque nas televisões e nas rádios. Acentuam os meios da Comunicação que se trata de um verdadeiro artista, com habilidade a dizer chega, um fenómeno. Peço, desde já, desculpa, mas palavra que não estou a tentar enganar quem quer que seja. Dispenso a citação do biberão, da chupeta, da roca, das fraldas e dessas coisas todas que, no caso, não têm razão de ser.

Porque este Bebé é já um moço de vinte anos, futebolista, que nem chegou a passar pela Liga portuguesa, em competições oficiais. Resumindo: Tiago Manuel Dias Correia, lisboeta, acaba de ser comprado pelo Manchester United ao Vitória de Guimarães por uns «modestos» nove milhões de euros. E, de repente, transformou-se na Cinderela desta época estival.

A história conta-se em meia dúzia de frases. Nascido numa família muito carenciada, o miúdo caiu na rua de onde o tiraram para entrar na Casa do Gaiato de Loures. Fez-se homem na instituição fundada pelo Padre Américo – que não o conheceu? – e foi lá que se transformou num cidadão de bom comportamento e arrancou para a prática do futebol. Começou pelos juniores do Loures e dali seguiu para o Estrela da Amadora, tendo feito parte da Selecção Nacional de Futebol de... Rua, em 2008.

E neste defeso, foi contratado pelo Vitória de Guimarães que por ele pagou noventa mil euros. Onde apenas alinhou nos jogos de preparação. E, de repente, o clube de Sir Alex Ferguson não foi de modas. A troco dos tais nove milhões de euros pagos ao clube da cidade-berço, transferiu-se para os ingleses. Uma história de fadas, cujos episódios apenas começaram, pois que esta procissão futebolística apenas começou a sair do adro. Modesto, com um coração de ouro, é um exemplo real, de acordo com o Padre Arsénio que dirige hoje a Obra da Rua.

Ponto final, para já. O que se vai seguir terá de ser acompanhado com a atenção devida. «Não tenhas medo de ser quem és, agarra-te a tudo o que te faz bem e põe em prática tudo o que aqui aprendeste», são as palavras que lhe foram dirigidas pelo sacerdote, ouvido por A Bola.

Num País como o nosso, em que os incêndios dão água pela barba a todos nós, em que as chamas já causaram mortes entre os bombeiros, saber desta estória, dá-nos alento. Num País como o nosso, em que a Justiça é uma bandalheira desenfreada, ficamos todos um pouco menos deprimidos, com o milagre deste Bebé. Num País como o nosso, em que um advogado e anterior deputado está enrolado num crime de assassínio – ou vários outros – que saltitou do Brasil para cá, saboreamos gostosamente este Bebé sem chucha. Temos de lhe agradecer o que nos oferece.

Que é muito mais do que os nove milhões.