sexta-feira, 15 de outubro de 2010

«Dito & Feito»

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Por José António Lima

PASSOS COELHO tem dois desafios de vulto pela frente. O primeiro é imediato e terá que o ultrapassar nos próximos dias.

O líder do PSD já percebeu, ou já o fizeram perceber, que a ideia de chumbar o Orçamento para 2011 é politicamente suicida. E já compreendeu que a sua margem de recuo é mínima e estreita, depois de ter falado de mais e vezes de mais sobre o tema, radicalizando imponderadamente a sua posição e o seu discurso.

Agora, terá que revelar todo o seu talento político para dar o dito por não dito. Para não se afundar num voto irresponsável e afundar, com ele, o país. Até porque a única maneira de obrigar José Sócrates a pagar o desastre a que conduziu a economia e as finanças nacionais é forçá-lo a ficar no Governo nos próximos meses, enfrentando os protestos da crise, o aumento do desemprego, o descalabro anunciado do défice de 2011.

O segundo desafio de Passos Coelho é de médio prazo e bem mais complicado. A receita de Sócrates para compor o défice, com os seus vários PEC, abateu-se, uma vez mais, sobre os funcionários públicos. Mas deixou quase incólume o gigantismo do aparelho de Estado com os seus incontáveis braços (empresas públicas e municipais, institutos, fundações, gabinetes e seus derivados), onde se alberga a sua clientela, em milhares de empregos improdutivos - que são a sua última e intocável base de apoio partidário e eleitoral.

Ao despesismo deste polvo gigantesco de serviços e repartições clientelares, com empregos e mordomias à discrição (direito a carros e motoristas, despesas de representação, refeições e viagens bem pagas), juntam-se os gastos milionários com pareceres de juristas e advogados amigos, com gabinetes de comunicação e empresas de promoção de eventos, etc., etc.

Pior ainda: à colossal dívida escondida das empresas do sector público (da Estradas de Portugal à Parpública, da RTP à CP) somam-se os encargos galopantes da política socrática de atirar as despesas para gerações e anos futuros: dos juros crescentes da dívida aos custos imparáveis das parcerias público-privadas ou da factura dos fundos de pensões. São milhares e milhares de milhões de euros que manterão o défice de 2011 - e de 2012 e de 2013... - em níveis insustentáveis.

Como irá Passos Coelho no papel de primeiro-ministro, provavelmente já em 2011, resistir a este monstro despesista? Sabendo-se, ainda por cima, que o clientelismo partidário no aparelho de Estado não é só uma doença congénita do PS, mas também do PSD?
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«Sol» de 15 Out 10