segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Palavras

Por João Paulo Guerra
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FUTEBOL FOI A PALAVRA mais escrita no conjunto dos jornais portugueses de informação geral em 2008.
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Curiosamente, isto coincide com a publicação de outros dados que revelam que os jogos do campeonato de futebol estão a perder este ano uma média de mil espectadores por encontro, em relação ao ano anterior. A outra curiosidade é que a palavra futebol só não é a mais escrita nos jornais desportivos, onde é ultrapassada pelas palavras Benfica e Porto.
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E é melhor parar por aqui a citação dos dados do estudo sobre utilização das palavras nos jornais, pois cada novo elemento contribui para acentuar mais ainda os tons do retrato de um país deprimido, e deprimente, que sublima as suas frustrações a ler tricas sobre o mundo do futebol. Ou, melhor dizendo, o submundo da opacidade e da impunidade institucionalizadas.
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Os portugueses, que cada vez vão menos à bola, cada vez lêem mais sobre os casos do futebol. Evidentemente. Têm que se preparar para as grandes discussões intelectuais ao seu alcance. Ou será que os portugueses haviam de discutir no café o último livro que não leram, a última ideia que não tiveram, o último sonho de que já acordaram? Portugal arrasta pela História a fatalidade do seu destino: 500 anos de Inquisição, 50 anos de salazarismo, uma fugaz ilusão de Liberdade e uma espécie de democracia, em que o povo não governa mas muitos se governam em seu nome.
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E perante este quadro trágico que hão-de ler e sobre que hão-de conversar os portugueses? Sobre futebol caseiro, que não é bem o mesmo que o grande espectáculo do jogo da bola. O futebol em Portugal tem uma enorme originalidade: nem a bola é redonda nem são apenas onze de cada lado. O que é sempre um grande motivo de conversa.
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«DE» de 2 de Fevereiro de 2009