
QUEM SE DESLOCAR ao Fórum Eugénio de Almeida, em Évora, terá oportunidade para ver uma sucessão surpreendente de gravuras. Algumas são paisagens, desenhadas de forma convencional, mas com um pormenor e um cuidado pouco usuais. Outras são figuras míticas — dragões, felinos com asas, castelos flutuantes. Outras ainda são jogos visuais que surpreendem o visitante, pois nunca são o que parecem ser. Há esferas que afinal são círculos, há pássaros que se transformam em campos lavrados e talhões de terreno que se transformam em aves. É um mundo de surpresas.
“A Magia de M.C. Escher”, como foi com propriedade chamada a exposição, traz até nós 50 gravuras do artista Maurits Cornelis Escher, que nasceu em 1898 na Holanda, trabalhou em Itália, Espanha, Suíça e Bélgica, e veio a falecer no seu país em 1972. É a primeira vez que uma mostra de originais deste artista tem lugar no nosso país, o que por si só justifica uma viagem até à cidade alentejana. O visitante não ficará desiludido. É uma oportunidade para ver uma retrospectiva de trabalhos que vão desde 1927, quando o jovem Maurits desenhava paisagens, até 1965, quando estava completamente absorvido num mundo interior de figuras impossíveis e de abstracções dominadas pela ideia de infinito.
A grande viragem deste artista dá-se entre 1934 e 1937, quando deixou o sul da Europa, que o absorvia pelas suas paisagens, e se deslocou para a Suíça, a Bélgica e, finalmente, a Holanda. Na passagem por estes países, deixou progressivamente de se inspirar no mundo visual externo e começou a empenhar-se em construções mentais abstractas, que expressam conceitos matemáticos. Foi a partir daqui que as suas gravuras ganharam um cunho próprio, sem par no munda das artes visuais.
Entre 1937 e 1945, no que o seu biógrafo Bruno Ernst designa como “período das metamorfoses”, Escher construiu motivos que gradualmente se transformam noutros. É disso exemplo a gravura “Sky and Water I”, em que pássaros se transformam em peixes e peixes se transformam em pássaros. Nesta exposição há várias obras deste período, incluindo o celebérrimo “Magic Mirror” em que dragões tridimensionais se esvaem numa superfície plana, apenas para reaparecerem a três dimensões do outro lado do espelho.
No chamado “período das perspectivas”, que decorre de 1946 a 1956, Escher explora ângulos pouco habituais. Leva a ilusão da observação fotográfica ao limite, juntando na mesma figura imagens que corresponderiam a pontos de observação distintos.
Finalmente, no seu “período das aproximações ao infinito”, entre 1956 e 1970, o artista holandês explora repetições de motivos, aparentemente sem limites, e desenvolve várias figuras impossíveis.
Ao longo da vida, Escher foi estudando o contraste entre a ilusão tridimensional que a perspectiva nos fornece e a realidade plana da superfície a que os desenhos estão confinados. São temas geométricos a que se juntam muitos temas matemáticos, como a banda de Moebius, uma superfície que tem um lado apenas, as curvas loxodrómicas de Pedro Nunes, as pavimentações do plano e os cinco sólidos platónicos. Não é de espantar que os matemáticos gostem de Escher. O que é fabuloso neste artista é que todos, incluindo as crianças, se maravilham com a sua arte.
«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 20 Nov 10 (adapt.)