segunda-feira, 29 de março de 2010

«Dito & Feito»

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Por José António Lima

COM A APRESENTAÇÃO do PEC, que é a negação em toda a linha do programa eleitoral com que o PS se apresentou aos portugueses ainda há seis meses, a casa socialista começa a vir abaixo. «Não podemos estar assim a desbaratar o nosso próprio património», protesta Soares. É «um custo social excessivo que vai recair sobre a classe média e média baixa», acrescenta Alegre. «O PS entrou numa deriva à direita», diagnostica Cravinho. «Confesso a minha incapacidade em aceitar que um Governo de centro-esquerda tome esta opção», proclama Pedroso. E até no interior do Governo já aparecem ministros como Vieira da Silva a confessarem publicamente: «Esta situação que nós vivemos, obviamente, não é uma situação que me deixa feliz».

Enquanto a casa socialista vem abaixo, José Sócrates mantém-se em estado de negação permanente e numa atitude de irremediável obstinação: «O PEC é credível. É o PEC de que o país necessita. Dizer que o PEC não aposta no crescimento não é verdade», repete o chefe do Governo em entrevistas e intervenções sucessivas.

A verdade é que este PEC representa, para o PS, o fim das ilusões. É a machadada final, e liberal, numa governação que perdeu qualquer marca de esquerda, que aumentou o desemprego, os impostos e o endividamento do país. Consuma a descrença numa liderança que arrastou o partido para uma teia de suspeições e casos obscuros, incapaz de lidar com a liberdade imprensa e de crítica. Anuncia o desmanchar da feira de um círculo de poder que se vai esvaindo nas suas perversões e contradições.

Para Sócrates, as brechas que se abrem no PS e no Governo são o sinal de que o seu caminho está a chegar ao fim. Debilitado no plano pessoal pela sucessão de episódios mal esclarecidos, desacreditado no plano nacional pelos resultados medíocres de seis anos de Governo (e mais um PEC de austeridade e empobrecimento), também no plano partidário Sócrates começa agora a ser um líder cada vez mais só. Como se vê.

Não sendo provável, a nove meses de eleições presidenciais, uma convulsão política que leve à queda do Governo, Sócrates está obrigado a permanecer em S. Bento até 2011. Por força das circunstâncias e em lenta agonia política.
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«SOL» de 26 Mar 10