quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Pouca-terra

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Por João Paulo Guerra

Agora foi a linha férrea Miranda do Corvo – Coimbra: fechou ao fim de 103 anos de circulação.

DIR-SE-Á QUE É O PROGRESSO e que o futuro avança assim, inexoravelmente, espezinhando razões históricas, civilizacionais, ambientais, da economia e do interesse locais. A questão é que o futuro, em Portugal, tem avançado às arrecuas. Desde os governos de Cavaco Silva, o encerramento de linhas e troços ferroviários passou a ser uma espécie de desígnio nacional. E, como está bem à vista, não foi por isso que Portugal avançou... a não ser rumo à desertificação. A desertificação do Interior-Norte é directamente proporcional ao desinvestimento em vias-férreas e comboios.

Aliás, o encerramento de linhas de caminho de ferro é apenas um capítulo da mesma política que arrasou outros sectores da economia, da história, da soberania e da vida colectiva portuguesas. Em nome do progresso, deliberadamente, sucessivos governos portugueses desmantelaram sectores imensos de actividade como fossem a marinha mercante, as pescas, a agricultura. E ninguém venha dizer que Portugal ficou mais rico, mais independente ou mesmo mais moderno com tais políticas de terra queimada ou, como também poderá dizer-se aludindo às vias-férreas, políticas de pouca-terra. Poderão esgrimir-se as mais eruditas teorias, as mais modernas correntes de opinião, a mais sonante propaganda. Nada disso altera a realidade que é o empobrecimento, a desertificação e a submissão do País.

A grande questão é que excluindo os grandes interesses plutocráticos, os políticos portugueses não têm em geral qualquer ideia ou projecto sobre o futuro do País. E assim, feche-se, liquide-se, destrua-se, arrase-se. E o deus dinheiro que reconstrua um país à sua imagem e semelhança.

«DE» de 6 Jan 10

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