sábado, 16 de janeiro de 2010

Em Goa é mesmo um descanso

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Por Antunes Ferreira

A MINHA Professora (assim mesmo, com caixa alta, que ela bem a mereceu, merece e merecerá) da quarta classe, denominação que cheira a Neolítico, era a Senhora Dona Clélia Marques. Que acumulava com a direcção do colégio Mouzinho da Silveira, ali juntinho à Avenida de Berna, no local onde hoje se encontra o Teatro Aberto.

Eu morava então na Rua Filipe da Mata, ao Rego, e todas as manhãs o Senhor Alfredo, marido da porteira Senhora Ângela e desempregado profissional, me levava lá, vigiando-me cuidadosamente para que eu não pusesse o pé em ramo verde. O bom homem, militante da copofonia lusitana, até levava a minha pasta, penso que para eu não me cansar muito, pois de seguida era necessária toda a atenção nas aulas – uma trabalheira.

Ora muito bem, os que ainda me lêem (poucos) devem estar um tanto perplexos com estas linhas iniciais. Vejo-os daqui, ainda que escassos, a perguntarem-se – mas o que é que a gente tem a ver com isso. Estão cheios de razão esses últimos moicanos sobrevivente neste território que dizem ser um país.

Mas, explico-me já, se me quiserem acompanhar. Mas, mesmo que o não queiram, quem escreve sou eu e pronto. Hoje, diz-se mais prontos, mas ainda aí não cheguei. Neste particular, e para além desta minha denodada vontade de alinhavar palavras, também conta, e de que maneira, a Margarida Maria, que me meteu nesta alhada do SexoForte. Se ela não estiver pelos ajustes… eu escrevo na mesma e ela deitará o papel na cesta secção.

Porquê, então, esta minha viagem ao começo dos anos 50. Porquê, ainda, a referência sentida à minha Professora? Porquê, finalmente, a indicação das andanças quotidianas de casa para a escola e vice-versa, acompanhado pelo Senhor Alfredo? Porque, uma vez mais, vou, ou melhor, vamos, a minha mulher Raquel e eu, à terra dela, ou seja a Goa. Desta feita, também a Damão e a Diu.

Ensinou-me a Senhora Dona Clélia que as três parcelas constituíam o então Estado Português da Índia. Com mapa e tudo, impresso a cores na Litografia Universal, Lda, Porto. Em boa verdade, e apesar de toda ajuda gráfica que a distinta mestra nos proporcionava, eu nunca soube muito bem onde ficava o dito cujo. A Litografia Universal, Lda era mais fácil de localizar: Rua de São Victor, 4000 Porto. O pessoal nortenho sempre tem cada rua mais comprida…

Pela vida fora, fui evoluindo (?) pelo menos no sentido do conhecimento geográfico. Estava já no segundo ano de Direito quando a então «famigerada e criminosa» União Indiana do «bandido» Nehru entrou no Estado Português da Índia e acabou-se. O Estado assim denominado e o estado a que ali se chegara. Então, começara eu a namorar a que é hoje minha mulher, a Raquel, nada e criada lá. Brâmane, para que conste, e com árvore genealógica e tudo, de que eu, miserável pária lusitano, dei cabo pelo santo sacramento do matrimónio.

Esta é mais uma viagem de várias que já ali fiz. Esse salutar propósito de ir à terra, mais precisamente à santa terrinha, é um pouco mais difícil de concretizar quando ela, ao contrário da Malveira, Freixo de Espada à Cinta ou Altura, fica a uns belos milhares de quilómetros de aqui. Mas, vale a pena a deslocação. Mesmo se a alma é pequena.

Por isso, este escrito. Desde o próximo domingo, 17, até 9 de Março, não me aturam. É que em Goa é mesmo um descanso. Juro. Isto, se não me der no cristalino bestunto escrevinhar alguma coisa – de lá. Agora penso que entendem o porquê de, ao fim de 46 anos de casado não me poder divorciar. É por mor dos bilhetes grátis ou quase que não poso perder. A Raquel é TAP. E mesmo aposentada tem direito a eles. Ela – e eu…