segunda-feira, 12 de julho de 2010

Computadores no ensino

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Por Nuno Crato

TIRAR CONCLUSÕES fiáveis sobre as causas de fenómenos sociais é notoriamente difícil. O físico Richard Feynman salientava a dificuldade com que os físicos tiram conclusões a partir de estudos muito rigorosos, feitos por dezenas de cientistas e nas mais variadas condições laboratoriais. E contrastava essa dificuldade com o desembaraço com que alguns sociólogos parecem tirar conclusões a partir de dados vagos e controversos. «Tenho a vantagem de saber como é difícil descobrir verdadeiramente alguma coisa», dizia, «como se tem de ser cuidadoso a verificar as experiências, como é fácil errarmos e enganarmo-nos».

Nos estudos sociais, uma das razões por que é fácil errarmos e enganarmo-nos é o facto de os dados misturarem tantas variáveis que o efeito daquelas que queremos estudar é facilmente ofuscado por outras que lhes vêm associadas. É muito difícil, por exemplo, saber se a introdução de computadores no ensino melhora ou prejudica a aprendizagem, pois ao mesmo tempo que são introduzidos os computadores são feitas outras mudanças e não se sabe se for por estes ou por aquelas que as melhorias ou os retrocessos aconteceram. Também é difícil saber se os jovens que estudam em casa com recurso a computadores têm, só por esse facto, uma vantagem significativa. As famílias com posses para oferecer computadores aos filhos também lhes oferecem outros recursos de estudo (explicadores, mais acesso à cultura, melhores condições de vida).

Num estudo recente, um grupo de investigadores da Universidade Duke, na Carolina do Norte, nos Estados Unidos, procurou ultrapassar estas dificuldades [ver aqui]. Analisou uma amostra gigantesca, de 150 mil jovens, seguidos ao longo de cinco anos. Os dados permitiram observar os resultados dos alunos em matemática e na leitura em dois momentos: antes e depois da introdução de um computador para o estudo em casa. Desta forma, foi possível estudar o seu impacto no progresso dos estudos de cada estudante, independentemente do seu meio social.

Os resultados são surpreendentes. Após a introdução do computador pessoal no seu quarto de estudo, os jovens não melhoram os seus conhecimentos. Os rapazes têm mesmo a algum retrocesso escolar, um retrocesso modesto, mas estatisticamente significativo. Não se sabe a que isso se deve, mas os investigadores notaram a tendência a usar os computadores não como instrumento de estudo, mas sim como meio de comunicação e de diversão. O correio electrónico, as mensagens instantâneas, os jogos na Internet e outras actividades tornam-se uma fonte de dispersão constante.

Poder-se-ia também pensar que a oferta de computadores aos jovens de meios mais desfavorecidos seria um meio de igualização social. Mas este estudo notou que o retrocesso subsequente à introdução de computadores é maior é precisamente nesses jovens. Nas famílias com mais dificuldades, o apoio familiar na orientação do uso dos computadores para objectivos escolares é menor e os jovens dispersam-se mais.

Quer isto dizer que não se devem usar computadores no ensino? De forma alguma. Mas quer dizer que as novas tecnologias não são, por si só, solução para os problemas de aprendizagem. Nada substitui o professor e o estudo organizado.
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«Passeio Aleatório» - «Expresso» de 10 Jul 10