quarta-feira, 28 de julho de 2010

Deixa arder

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Por João Paulo Guerra

PORTUGAL é um país impreparado. No Inverno morre-se de frio, no Verão sufoca-se de calor. Com as chuvas, vai tudo na enxurrada. Com o calor, o país arde.

E por mais que se saiba que é assim, e que não há surpresas para melhor, o poder deixa arder e deixa ir na enxurrada.

Claro que há excessos descontrolados no clima. Mas já se sabe, quando se aproxima o Verão, que vem aí a chamada "época dos fogos". Só falta ter inauguração com ministros e fanfarra dos bombeiros. Como se sabe que com a chegada do Inverno aumenta o risco de cheias e enxurradas.

Desde a mais tenra idade profissional fiz reportagens de fogos no Verão e de cheias no Inverno. Fogos florestais no Vale do Vouga, inundações no Vale do Tejo, por exemplo. E o que é extraordinário é que todos os anos toda a gente dá pelos mesmos descuidos e negligências, ao nível mais rasteiro da prevenção. Em Portugal não se limpam as matas para obstar ao avanço das chamas no Verão; como nem sequer se limpam as sarjetas nas cidades para impedir as cheias nas ruas. Coisas simples, elementares, que dariam outra segurança ao país e às pessoas, são menosprezadas porque não rendem dividendos eleitorais. As únicas grandes diferenças entre os tempos em que comecei a fazer notícias de fogos e cheias e a actualidade é que o clima está mais descontrolado e o país ainda mais desordenado e descuidado, por via da desordem da especulação.

E é assim que, com o país a arder, a Liga dos Bombeiros Portugueses veio alertar que os meios aéreos de combate a incêndios não estão a ser usados em todos os grandes fogos florestais no país, ao contrário do que define a directiva operacional, elaborada pela Protecção Civil. Os investimentos de milhões são, acima de tudo, para exibir nos telejornais.

«DE» de 28 Jul 10